A TEORIA DO MÉTODO - DESCARTES

archivo del portal de recursos para estudiantes
robertexto.com

ligação do origem

Teoria do Método

" A filosofia que cultivo não é tão bárbara nem tão cruel que rejeite o gozo das paixões. Ao contrário, é somente nela que coloco toda a doçura e felicidade da vida".
René Descartes

IMPRIMIR

INTRODUÇÃO

A reflexão filosófica dos séculos XVII e XVIII desenvolve os seus motivos fundamentais paralelamente ao desenvolvimento das ciências matemáticas e naturais e com o consolidamento dos Estados nacionais.

O Renascimento italiano com Galilei e Maquiavel havia dado a primeira resposta ao problema da ciência e da política. Com Campanela havia esclarecido a nova exigência filosófica: a autoconsciência como ponto de partida do filosofar. Galileu Galilei, ainda que dentro de certos limites, dá um caráter humanístico ao método experimental: experiência e cálculo matemáticos entendidos como dois momentos de um único método com o qual o homem interroga e atua sobre os fenômenos da natureza. A ciência se funda sobre a experiência, mas o sujeito ativo da experiência é o homem. Por vias diversas, Campanela e Galilei colocam o problema crítico do conhecimento.

A autonomia da ciência é também autonomia do pensamento. A autonomia do Estado é a autonomia do indivíduo que reivindica os próprios direitos e a sua liberdade no próprio Estado. O Espírito do pensamento europeu dos séculos XVII e XVIII é o caráter humano da filosofia, da ciência, da política; afinal bem diverso do da Escolástica.

O problema do método caracteriza a origem da ciência moderna. Interessava tanto à ciência quanto à filosofia, dando origem a novas e importantes questões gnosiológicas e metafísicas.

Galilei fixou os dois momentos do método experimental, a indução e a dedução. Bacon aprofunda a indução e a ela subordina a dedução. Descartes, ao contrário, indica o primado da dedução.

Os dois momentos do método acabam por se apresentar como dois métodos, como duas fontes de conhecimento. Originam as duas correntes do pensamento moderno: o empirismo inglês (Hobbes, Locke, Berkeley, Hume) e o racionalismo (Descartes, Melebranche, Espinoza, Leibniz).

Bacon formula os problemas que o empirismo posterior aprofundará. René Descartes inicia o racionalismo moderno e formula os problemas que desenvolverá e sistematizará o próprio racionalismo no seu longo diálogo crítico com o empirismo. Leibniz, em um momento posterior, reelabora com originalidade o racionalismo cartesiano, formulando um sistema que, apesar de especulativo, antecipará e informará, além da filosofia de Kant, boa parte da filosofia elaborada até nossos dias.

 

FRANCIS BACON (1561-1626)

O inglês Francis Bacon viveu na época das primeiras conquistas da ciência, das grandes invenções como a imprensa, a pólvora, a bússola. Sua confiança básica era no progresso da ciência.

Para ele, saber era poder, mas não um saber temático ou contemplativo e sim prático e ativo. Não se tratava de instaurar o reino da verdade entre os homens, mas o reino do homem sobre as coisas.

O melhor modo para dominar a natureza é observá-la e interrogá-la, mas para isso é necessário criar um novo instrumento de investigação. Até agora as invenções tinham sido obra do acaso. Aceitas a experiência e a razão como fonte do conhecimento, a investigação metodológica se tornava cada vez mais urgente. É necessário formular um método. Para Francis Bacon esse método será a indução experimental.

Segundo Bacon, o processo dedutivo ou silogístico, válido como instrumento de demonstração é ineficaz como instrumento de descoberta. O silogismo serve assim para demonstrar o que já se conhece, para fazer conhecer novamente o que já se conhecia nas premissas. Ao contrário, a indução dos fatos particulares observados nos leva a inferir uma verdade que antes não era conhecida. A insuficiência do método aristotélico (Organon) é de ter tratado difusamente a dedução e, ainda assim, em prejuízo da indução. Bacon se propõe integrá-lo (Novum Organum), de modo a arrancar da natureza os seus segredos através da experiência e da observação, as únicas que, fazendo-nos conhecer as causas das coisas, nos dão o domínio sobre elas. A ciência, para ele, é o instrumento do qual o homem se serve para interpretar e dominar a natureza.

O método indutivo de Bacon é resultante de dois momentos: o momento negativo (pars destruens) e o momento positivo (pars construens).

No primeiro, o intelecto liberta-se dos preconceitos que dificultam o adequado conhecimento das coisas, ultrapassa a si mesmo pela crítica, adquire consciência dos próprios erros.

Ao método característico da lógica tradicional, Bacon contrapõe o método da interpretação da natureza que, seguindo a experiência, gradualmente ascende das coisas particulares aos princípios, dos quais nascem novos conhecimentos. No primeiro livro do Novum Organum reúne, em quatro grupos, as fontes dos erros, os ídolos ou falsas imagens da realidade, que são:

a) Idola tribus - derivam da natureza da mente humana, induzindo-nos a pensar as coisas e suas relações em analogia ao homem;

b) idola specus - preconceitos próprios da formação mental do indivíduo singular devidos a inclinações naturais ou a hábitos adquiridos com a educação;

c) idola fori - derivam das relações com os outros homens, da vida social e devem-se, sobretudo, ao uso convencional das palavras, levando quase sempre a discussões inúteis;

d) idola theatri - derivam da sugestão exercida pelas teorias tradicionais, pelos sistemas filosóficos que, como os enredos teatrais, são também construções fictícias. O excessivo respeito à sapiência antiga é fonte de erros.

Na gnosiologia de Bacon é viva a exigência crítica, libertada destes preconceitos, a mente purificada está apta a aplicar à natureza, num segundo momento, o método da indução ou interpretação.

Deve-se partir da experiência e proceder de modo ordenado, interpretando-se, pacientemente a natureza e não antecipando-a . O processo indutivo deve ser gradual e interpretativo. O objeto da investigação é a essência ou a forma do fenômeno que deve ser encontrada entre as várias circunstâncias em que o próprio fenômeno se apresenta. Para fazer isso é necessária, após a obtenção da matéria da experiência, a formulação do que Bacon denominou tábuas:

a) Tabula presentiae - nesta primeira tábua arrolam-se os casos em que o fenômeno se verifica ainda que em circunstâncias diversas;

b) Tabula absentiae - na segunda tábua são arrolados os casos em que o fenômeno não se verifica, mesmo apresentando-se circunstâncias semelhantes às reveladas na tábua precedente;

c) Tabula graduum - nesta terceira, arrolam-se os casos em que o fenômeno se verifica nos seus graus crescentes ou decrescentes.

Assim, a forma de um fenômeno consistirá na propriedade sempre presente na primeira tábua, sempre ausente na segunda, com variações de aumento ou diminuição na terceira. Não se tem ainda uma demonstração segura, mas pode-se formular uma hipótese provisória, a qual servirá de guia às experiências que irão confirmá-la ( instantiae). Das muitas instâncias possíveis, a decisiva é a crucial, aquela que demonstra a conexão necessária de um fenômeno com outro ou a sua independência dos outros. A instância crucial estabelece, em suma, a causa ( ou forma) verdadeira de um fenômeno.

Bacon, ao colocar o conhecimento da forma como fim da investigação indutiva, não distingue a física da metafísica, ao contrário de Galilei que, considerando a lei como relação entre fenômenos, afirma ao mesmo tempo a autonomia da ciência e da metafísica.

A justificação da indução não está no sentido mas no intelecto, como concluiu Galilei, que à indução uniu a dedução. Em Bacon, ao contrário, a passagem da hipótese à lei é sempre operada pela experiência sensível e por isso a lei não pode ser necessária. Destarte, o empirismo inglês de Hobbes a Hume, presos a esta forma de concepção da experiência, acabam por desaguar no subjetivismo ou cepticismo.

 

RENÉ DESCARTES (1596 - 1650)

O filósofo francês, matemático e cientista René Descartes, foi um dos mais importantes e influentes pensadores da história da humanidade. Como filósofo, ele é sempre chamado de "o pai da moderna filosofia" e é visto como uma ponte entre a Escolástica e a Filosofia moderna. Como matemático Descartes fundou a geometria analítica e deu origem às Coordenadas e Curvas Cartesianas. Ele também contribuiu para a Álgebra.
Conforme já tivemos oportunidade de observar no trabalho anterior sobre a Escolástica, apresentado pelo grupo que nos precedeu, "o século XVI assinala uma época de decadência para a Escolástica. As novas idéias que se infiltraram na Literatura e na Filosofia, a restauração de antigos sistemas filosóficos, particularmente o platonismo, a reforma protestante, prepararam aquele movimento filosófico que deu origem à Filosofia moderna. O principal iniciador desse movimento foi Descartes, cuja influência se exerceu não só na França, mas também em outros países da Europa."

O filósofo francês nasceu em 31 de março de 1596 em uma pequena cidade em Touraine, chamada La Haye (agora chamada La Haye - Descartes ou simplesmente Descartes) e morreu em 11 de fevereiro de 1650. Quando tinha um ano de idade viu-se privado de sua genitora que faleceu em 1597 e, aos dez anos de idade, foi enviado, pelo seu pai, para o Colégio Henri IV em La Fleche, que era, na época, uma vitrine da educação jesuíta e um dos mais proeminentes centros de treinamento acadêmicos da Europa, onde recebeu ensinamentos da tradicional filosofia Aristotélica.

Descartes deixou La Fleche em 1614 para estudar Direito Civil e Canônico em Poitiers, e em 1616 recebeu o grau de bacharel e licenciatura em Direito.

Em 1618, Descartes juntou-se ao exército, sob o comando do Príncipe Maurício de Nassau, como voluntário, não remunerado, mas aparentemente ele nunca viu um combate. Ele parece ter se interessado em usar o serviço militar como um meio de conhecer o mundo.

Jovem, ele começou a trabalhar nos problemas de matemática e mecânica sob a influência do cientista Isaac Beeckmann, que se tornou seu amigo até 1630 quando se separarão. Em 1922, Descartes instala-se em Paris, onde permanece até 1928. Nesse período, redige um pequeno tratado sobre "os elementos dos sólidos", elabora um método de construção das tangentes, interessa-se pela Ótica, realiza pesquisas sobre a refração da luz e manda confeccionar lunetas para observação astronômica.

Durante esses anos, Descartes mantém contatos com o Padre Mersenne, jesuíta para quem as Matemáticas "conduzem o entendimento à verdade" e "o transportam para a contemplação das coisas abstratas, intelectuais e divinas". Mantém contatos igualmente com o Cardeal de Bérrulle que, impressionado pela força e pelo rigor do espírito de Descartes, exorta-o a se consagrar inteiramente à Filosofia.

No inverno de 1628, retira-se, afinal, para a Holanda, que lhe ofereceu uma maior liberdade intelectual e onde começa a trabalhar em seu primeiro tratado - Regulae ad directionem ingenii (Regras para a Condução do Espírito na busca da verdade ), em que afirma sua crença na unidade das ciências e sua confiança em uma razão bem dirigida. A Holanda significa para ele a calma, a paz - contemplemos os quadros de Rembrandt - e a solidão de que precisa para continuar sua "aventura".

Nas cartas que escreveu ao padre jesuíta Mersenne, Descarte fala em acústica, óptica, balística e mecânica. Revela interesse pelas manchas solares, pela natureza da luz, pelos mecanismos do olho.

Esses múltiplos trabalhos são a expressão de um projeto muito mais amplo, ou seja, um Tratado do Mundo: "eu me decidi a explicar todos os fenômenos da natureza, isto é, toda a Física."

Mas este tratado jamais será publicado enquanto Descartes viver. Após ouvir sobre a condenação de Galileu pela inquisição em 1633, por defender o sistema de Copérnico, Descartes, cujas teses se aproximam das de Galileu, inquieta-se e decide não publicar o seu Monde: "decidi queimar todos os meus papéis, ou , pelo menos, não permitir que ninguém os veja."

Descartes porém não cruza os braços e decide mandar publicar certos fragmentos de seu Monde. É assim que surge o Discurso do método para conduzir bem sua razão e procurar a verdade nas ciências. Esta autobiografia escrita para que "mesmo as mulheres" possam, através dela, "entender alguma coisa", e para que, também, "os mais sutis" nela encontrem "matéria suficiente para ocupar sua atenção", e acompanhada de três "ensaios": a Dioptrique, na qual Descartes expõe sua descoberta da lei de refração; a Géométrie, que apresenta suas pesquisas em matemática e, particularmente, sua geometria analítica; e, finalmente, os Météores.

 

GOTTFRIED WILHELM LEIBNIZ (1646-1716)

Leibniz viveu na segunda metade do Séc. XVII. Conheceu o empirismo inglês através da obra de Locke. Considerado um dos filósofos realmente a altura de um Aristóteles ou de um Descartes, teve uma autoridade científica indiscutida, tanto em matérias de jurisprudências, filosofia, física, matemática e teologia. Foi considerado com um dos cabeças enciclopédicas.

Teve a percepção clara de onde se encontrava a falha, ou defeito, isto é, o ponto fraco do empirismo inglês, apesar de não conhecer da matéria nada além do que a obra de Locke. Apesar disso, bastou-lhe o conhecimento das obras de Locke para se chegar ponto central onde estava a originalidade e ao mesmo tempo, a falha, o perigo do empirismo inglês. Viu de imediato que a falha consistia no seu intento de reduzir o racional a fático; a razão a puro fato, porque há uma contradição fundamental nisso:
- se a razão se reduz a puro fato, deixa de ser razão;
- se o racional se converte em fático, deixa de ser racional - porque o fático é aquilo que é sem razão de ser, enquanto o racional é aquilo que é razoavelmente, quer dizer, não podendo ser de outra maneira. Em conseqüência, percebeu de imediato, e com grande clareza, que o defeito fundamental de todo psicologismo, ao considerar o pensamento como vivência pura, é que o racional se convertia em puro fato, isto é, deixava cair sua racionalidade como um admnículo inútil. Porém não existe nada mais contraditório que o racional deixe cair sua racionalidade, porque então o que resta é o irracional.

 

VERDADES DE FATO E VERDADES DE RAZÃO

Assim, o ponto de partida de LEIBNIZ é este ponto central, desde as primeiras linhas do livro que consagra em refutar Locke. Locke escreveu o livro "ENSAIOS SOBRE O ENTENDIMENTO HUMANO". Após ler e estudar esse livro a fundo, LEIBNIZ redigiu umas notas que se fez publicar com o título NOVOS ENSAIOS SOBRE O ENTENDIMENTO HUMANO, logo após a morte de Locke. Nas primeiras linhas desse livro, desde logo, inicia levantando o problema no seu ponto central, distinguindo:
- verdades de razão e
- verdades de fato
O conhecimento humano compõe-se de umas verdades que chamamos de razão e de outras verdades que chamamos de fato.
As verdades de razão, são aquelas que enunciam que algo é de tal modo, que não pode ser mais que desse modo; ao contrário, as verdades de fato são aquelas que enunciam que algo é de certa maneira, mas que poderiam ser de outra. Concluindo,
- as verdades de razão são aquelas verdades que enunciam um ser ou um consistir necessário;
- as verdades de fato são aquelas verdades que enunciam um ser ou um consistir contingente.

Em suma: as verdades de razão são aquelas verdades que enunciam um ser ou um consistir necessário, enquanto as verdades de fato são aquelas verdades que enunciam um ser ou um consistir contingente. O ser ou o consistir necessário é aquele ser que é aquilo que é, sem que seja possível conceber-se sequer que seja de outro modo.

Assim, o triângulo tem três ângulos e é impossível conceber que não os tenha; assim todos os pontos da circunferência estão igualmente afastados do centro e é impossível conceder que seja de outro modo.
Pelo contrário: se dissermos que o calor dilata os corpos, poderia ocorrer que o calor não dilatasse os corpos. As verdades matemáticas, as verdades de lógica pura, são verdades de razão; as verdades da experiência física são verdades de fato; as verdades históricas são verdades de fato.
Corresponde nitidamente esta divisão à divisão que fazem os lógicos entre os Juízos apodícticos e os Juízos assertórios.
Juízos apodícticos são aqueles juízos em que o predicado não pode ser outra coisa que predicado do sujeito; ou, dito de outro modo, em que o predicado pertence necessariamente ao sujeito, como quando dizemos que o quadrado tem quatro lados. Todas as proposições matemáticas são deste tipo. Juízos assertórios, ao contrário, são aqueles juízos em que o predicado pertence ao sujeito; porém o pertencer ao sujeito não é de direito, mas de fato. Pertence ao sujeito, mas poderia não pertencer, como quando dizemos que esta lâmpada é verde. Ora, que esta lâmpada é verde é algo que está certo; porém é uma verdade de fato, porque poderia ser igualmente vermelha.
Locke propusera o problema da origem das idéias, da origem das vivências complexas. LEIBNIZ também propõe, mas partindo da seguinte distinção:
- verdades de fato e
- verdades de razão

Em primeiro lugar, as verdades de razão - e pergunta, se podem ser oriundas da experiência? De maneira nenhuma. Se as verdades de razão fossem oriundas da experiência, seriam oriundas de fatos, porque a experiência são fatos.

E se fossem oriundas de fatos, as verdades de razão seriam verdades de fatos; quer dizer, não seriam razão, não seriam verdades de razão, seriam tão casuais, tão acidentais como são as mesmas verdades de fato. Portanto, é inútil pensar-se que as verdades de razão possam originar-se na experiência.

 

GÊNESE DAS VERDADES

Então conclui-se que são inatas. Porque inatas? (são congênitas) Por inatas não queremos dizer que as crianças nascem no mundo sabendo geometria analítica. Inato não quer dizer que estejam impressas no nosso intelecto, no nosso espírito, na nossa alma,estas verdades; quer dizer que estão virtualmente impressas como uma semente ou num germe encontram-se estas idéias no espírito, constituem o próprio espírito.

No curso da vida, do espírito, essas idéias se desenvolvem, se explicitam, se formulam, estabelecem-se e formam-se em sua relação. A matemática surge, a matemática se aprende. Aprender matemática não é algo que se pareça em nada a comunicação que um hnomem possa fazer a outro de uma verdade de fato, vg, se alguém vem e me diz: o roseiral do seu jardim floresceu, este é um conhecimento de fato que entra em mim. Ocorre, que não se aprende assim matemática. Aprender matemática consiste em que as matemáticas latentes que estão em cada um saiam à superfície, que cada um descrubra as matemáticas. O próprio LEIBNIZ, nos seus NOVOS ENSAIOS, lembra a teoria da reminiscência, de Platão, aquele diálogo em que /sócrates chama a um jovem escravo, Ménon, para demonstrar a seus ouvintes que esse rapaz também sabia matemática sem as ter aprendido, porque as matemáticas surgem, nascem no espírito por puro desenvolvimento dos germes racionais que estão nele.

Nesse sentido, pode-se dizer que as verdades de razão são inatas, mas, não no sentido ridículo de pensar que um ignorante, que um menino já sabe geometria. Porém todo homem pode vir a conhecê-la, sendo que, para isso, não precisa de experiência, mas somente do desenvolvimento desses germes já existentes. LEIBNIZ expressa esse pensamento de forma clara: nada há no entendimento que não tenha estado antes nos sentidos.

Concluindo: a teoria de LEIBNIZ sobre a origem da verdade de razão descobre aquilo que, a partir dele, e sobretudo em Kant, vamos chamar de a priori, que é um termo latino que quer dizer: nesses arrazoados filosóficos, independentes da experiência. Diremos que as verdades de razão são a priori, independentes da experiência, são prévias à experiência, ou melhor dizendo, alheias a elas, se desenvolve florescendo dos germes que há em nosso espírito, sem necessidade de ter sido impressas em nós pela experiência, a qual não poderia imprimi-las, porque aquilo que imprime em nós são os fatos, e os fatos são sempre contingentes, nunca necessários.

Depois das verdades de razão vem o estudo das verdades de fato. As verdade de fato sim, são oriundas da experiência; são, produzidas pelas experiências, estão impressas em nós por meio da percepção sensível. São verdades como essas que dizíamos antes: essa lâmpada é verde. Essas verdades, porém, que são, com efeito, contingentes, que não são necessárias, nem por isso carecem de certa objetividade; são objetivas, enunciam também aquilo que o objeto é, dizem-nos a consistência do objeto. Porém isso que o objeto é, essa consistência do objeto, que é, com efeito, o conteúdo das verdades de fato, constitui um conhecimento de segunda ordem, um conhecimento inferior.

 

RACIONALIDADE DA REALIDADE

Há, pois, para LEIBNIZ, um ideal de conhecimento que é o ideal da pura racionalidade; e entre esse ideal de conhecimento plenamente realizado na lógica e nas matemáticas e o conhecimento um pouco inferior das verdades de fato que estão na física; entre esse ideal e essa inferior realidade do conhecimento humano, não há um abismo, mas, pelo contrário, uma série de transições contínuas, uma continuidade de transições, de tal sorte que o esforço do conhecimento, há de consistir em tornar cada vez mais vastos territórios de verdades de fato em verdades de razão. Como? Introduzindo as matemáticas na realidade. O conhecimento será cada vez mais profundamente racional quanto mais for matemático. E LEIBNIZ o comprova, inventando o cálculo infinitesimal, que faz dar um salto formidável ao conhecimento de fato da natureza e converte grandes setores da física em conhecimento racional puro. LEIBNIZ descobre precisamente o cálculo infinitesimal por aplicação desse princípio da continuidade entre o real e o ideal; da continuidade entre a verdade de fato, levada uma atrás da outra, e a verdade de razão. A relação que existe entre a verdade de fatom, com todos os antecedentes de razão suficiente que a sustentam, e a verdade de razão, é exatamente a mesma que há entre uma reta e a curva. Não existe, tampouco, um abismo entre a reta e a curva, porque, que é uma reta senão uma curva de raio infinito? E que é um ponto, senão um circunferência de raio infinitamente pequeno? Vemos como entre o ponto, a curva e a reta não existem abismos de diferença, mas, de um certo ponto de vista especial, que consiste em considerar tudo como gerado, como gerando-se na pura racionalidade dos germes lógicos que há em nosso espírito, existe um trânsito contínuo entre o ponto, a curva e a reta. Daí que possa esse trânsito escrever-se numa função matemática; numa função de cálculo integral e diferencial, de cálculo infinitesimal, sendo o ponto simplesmente uma circunferência de raio mínimo, tão pequeno quanto se queira, de raio infinitamente pequeno; sendo a curva um pedaço de circunferência de raio finito, constante, e sendo a reta um pedaço de circunferência de raio infinitamente longo, infinitamente extenso.

Estas considerações foram as que levaram LEIBNIZ a pensar que um mesmo ponto, quer se considere pertencente à curva, quer se considere pertencente à tangente dessa curva, esse ponto, um e o mesmo ponto, tem definições geométricas diferentes, segundo seja considerado como ponto da curva ou como ponto da tangente à curva. E então só faltará encontrar a fórmula que defina cada ponto em função do todo. E, foi precisamente a procura dessa fórmula que levou LEIBNIZ à descoberta do cálculo infinitesimal, com o qual uma enorme zona de verdades físicas, de fato, ingressam de pronto no corpo das verdades matemáticas, de razão.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SCIACCA, Michele Federico - História da Filosofia (Do Humanismo a Kant), Vol. II, Ed. Mestre Jou, São Paulo, 1968

MORENTE, Manuel Garcia - Fundamentos de Filosofia - Lições Preliminares, Ed. Mestre Jou, São Paulo, 1976

GAARDER, Jostein - O Mundo de Sofia (Romance da História da Filosofia), Companhia das Letras, São Paulo, 1995

DESCARTES, René - Discurso do Método, Editora Universidade de Brasília, 1989 

voltar   |     topo