O MODERNO PROCESSO PENAL X A INEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

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Graduado em Derecho por la Universidad Federal de Mato Grosso – Brasil
Servidor público federal, cargo de analista em reforma e desenvolvimento agrário, lotado na Procuradoria Federal Especializada do Instituto Nacional de Colonização Agrária – INCRA/MT, Brasil.

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RESUMO: Demonstraremos com o presente trabalho as principais facetas da ineficácia na prestação jurisdicional no Brasil, comprovadas pela sua mais alta corte – Supremo Tribunal Federal –, nos debruçaremos sobre os antagonismos do moderno processo penal em confronto com as dificuldades do estado para prestar adequada e eficientemente a tutela jurisdicional, os estigmas da morosidade da Justiça, as dificuldades de acesso a via jurisdicional e o papel da Defensoria Pública, a falta de um prazo razoável para a solução dos litígios e ainda algumas reflexões sobre o moderno processo penal garantista, ancorado nas premissas de direitos fundamentais previstas na Constituição Brasileira de 1988.

 

INTRODUÇÃO


A realização dos ideais do direito e da Justiça assenta-se na realidade social e no modus operandi de seus arquitetos jurídicos. Por isso, colhemos, mais especificamente da órbita Penal, a idéia de que os seus principais orbitais (Código de Processo Penal e o Código Penal) estão estruturados e esmiuçados no topo da pirâmide hierárquica das normas, delineadas dentro do arcabouço jurídico constitucional e da legislação de direito internacional (Tratados, Convenções, Resoluções etc) atinentes aos direitos humanos dos cidadãos [1], diretamente inter-relacionada com as normas infraconstitucionais (Lei de Execuções Penais, Contravenções Penais, Tóxicos, Comercial, Tributário, Ambiental etc).

Seguindo este raciocínio, identificamos que o Direito Penal é um trabalho minucioso de resgate da dignidade da pessoa humana através do embate entre o jus puniendi x jus libertatis. Jungindo-se ao munus judicante os cidadãos que se adequarem a norma proibitiva (penal), estejam elas dentro ou fora da sua circunscrição (crimes falimentares, ambientais, tributários, previdenciários etc) penal estrito senso. Coroando-se, com isso, a devida substituição da vingança particular (privada) que sempre permeou a história do pensamento jurídico[2] para a criação de um tercius (Estado/Juiz) no fito da solução dos conflitos e da pacificação social, fazendo desta sua realidade concreta.

Por esse giro, o Direito Penal têm per se um caráter de articulação da pretensão punitiva, uma vez que incumbe ao magistrado sopesar sobre a formação da culpa do acusado. Daí se releva o papel do órgão da acusação na busca de provas que sustentem sua pretensão original (denúncia), e, ao revés, à defesa incumbirá a descaracterização de toda a imputação criminal ou a mitigação dos prejuízos. Para isso, as fases processuais são manejadas, publicizadas e o conhecimento posto à prova na persecutio criminis, difundindo-se a idéia de que a Justiça deva garantir a premissa maior da liberdade particular, delineando limites para a segurança do indivíduo na realização de suas vontades. De acordo com essa reflexão, sobressaem da doutrina alienígena os ensinamentos do mestre Hegel[3], in verbis:

 

O direito é, então algo desconhecido e reconhecido, e querido universalmente, e adquire sua validade e realidade objetiva pela mediação desse saber e desse querer. [...] o membro da sociedade civil tem o direito de assistir ao julgamento e o dever de se apresentar perante o tribunal e de só perante o tribunal reivindicar o reconhecimento de um direito contestado. [...] Nas leis e na administração da justiça, há essencialmente um aspecto contingente, e nisso radica que a lei seja uma determinação geral que deve ser aplicada aos casos individuais.

 Nesse diapasão, não podemos nos esquecer da exposição dos principais clientes do Processo Penal (pessoas pouco abastadas), que traduzem nos autos a grande dificuldade de acesso à justiça[4] e, conseqüentemente, nos conduz ao campo da escassez de defesa.

Essa formula se amolda à situação corriqueira da falta do necessário ao próprio sustento, que de forma sensível informa a inexistência de pecúnia disponível para a constituição de banca advocatícia. Tal idéia reforça a sina de muitos cidadãos relegados a aguardar na fila os préstimos da valorosa Defensoria Pública, que conquistou sua independência e vista para um futuro de igualdade jurídica por meio da reforma do Poder Judiciário, introduzida pela E.C. nº 45.

Dentro dessa perspectiva podemos destacar inúmeros trabalhos atinentes ao acesso à justiça que desembocam na grande ferida social da desproporção de renda no país, reproduzindo o chamado inchaço social nas áreas circundantes (favelas) das grandes cidades. E, assistindo a esse prisma, podemos identificar o choque entre – justiça social x igualdade jurídica – para o resplendor social.

Por essa disputa, merece aplausos a esmerada explanação de Boaventura de Souza Santos quando demonstra os critérios de desigualdade no acesso a justiça, os quais podem ser classificados segundo a condição econômica, social e cultural dos agentes/clientes nos autos. Nesse turno e, pela imprescindibilidade do assunto, registro a delineação do autor quanto ao fator econômico[5]:

 

Muito em geral pode dizer-se que os resultados desta investigação permitiram concluir que eram de três tipos esses obstáculos: econômicos, sociais e culturais. Quanto aos obstáculos econômicos, verificou-se que, nas sociedades capitalistas em geral, os custos da litigação eram muito elevados e que a relação entre o valor da causa e o custo da sua litigação aumentava à medida que baixava o valor da causa. [...] É que são eles fundamentalmente os protagonistas e os interessados nas ações de menor valor e é nessas ações que a justiça é proporcionalmente mais cara, o que configura um fenômeno da dupla vitimação das classes populares face à administração da justiça. (grifo nosso)

 

Complementando as correlações acima, Sérgio Adorno dimana que a satisfação social não está limitada na ampliação do número de servidores da Justiça, mas sim em um trabalho sacramental de conscientização sobre o significado do direito, sua interpretação e aplicação diante e perante a sociedade, maior interessado na estabilidade social por meio da qual a pacificação é a solução. Melhor dizendo, “a problemática do acesso das classes populares à justiça não se resolve apenas com a ampliação física dos serviços da justiça, mas exige, progressivamente, alterações no modo de encarar a função judiciária e o próprio direito”.[6] (grifo nosso)

Nesse diapasão, os estudos sobre o perfil dos condenados e absolvidos em processos criminais no Município de São Paulo entre 1984/1988 revelam que a maior dificuldade ou desconfiança deles advinha da burocracia e do excesso de formalismo dos códigos, concebendo de forma direta que “a consciência é o reflexo no indivíduo das sanções da sociedade”[7]. Dentre elas, “as sanções negativas organizadas são notadamente procedimentos definidos e reconhecidos para pessoas cuja conduta é passível de desaprovação social”[8], como bem analisa o mestre Radcliffe-Brown[9]:

 

Num exame das funções das sanções sociais o mais importante não são os efeitos da sanção sobre a pessoa a quem se aplica, mas os efeitos gerais dentro da comunidade que aplica as sanções. [...] A função da sanção é restaurar a euforia social ao oferecer expressão coletiva definida aos sentimentos que foram afetadas pelo feito, [...] As sanções são assim de primordial importância para a sociologia, na medida em que são reações por parte da comunidade a fatos que afetem sua integração. (grifo nosso)

 

Por esta análise, exsurge alguns questionamentos substanciais – qual a verdadeira fonte da força do direito? Estaríamos diante de um impasse sobre a utilização da sanção como única e eficiente forma de sujeição do particular ao regramento legal?

A aplicação da norma incumbe ao juiz no veredicto da Lei. E, principalmente, dela abstrai sua historicização frente aos discursos jurídicos em confronto para a proclamação do direito, inibindo-se qualquer partilha desigual pela situação dos agentes envolvidos.

Analisando o campo das práxis e dos discursos jurídicos trazidos por Pierre Bourdieu[10], poderemos perceber que essas estruturas são regidas pelo monopólio de dizer o que é de direito, deduzida na interpretação e na equidade do decisum. O que fornece ao magistrado a prerrogativa de sempre aplicar o direito, independentemente que haja lacunas; e, nesse caso, a lei lhe direciona a análise processual de acordo com a analogia, os costumes, os princípios gerais do direito (art. 4º da LICC) bem como por meio da equidade.

Pela adequação setorial grafada, analisamos singelamente que o Processo Penal segue um norte (marcha) estabelecido por Lei (Código de Processo Penal) que esmiúça o amoldamento territorial, temporal, as particularidades dos prazos, etc. Por isso, a constituição dirigente brasileira alçou como princípio essencial desse processo a inafastabilidade do Poder Judiciário para manejar de forma peremptória o devido processo legal, assegurando a qualquer cidadão o acesso indiscriminado à justiça de forma voluntária (Processo Civil) ou coercitiva (Processo Penal).

Por este último, especificamente, assevero que suas características processuais identificam o seu ajustamento a indisponibilidade formal dos procedimentos legais, os quais devem ser colhidos e “fiscalizados” pelo magistrado a fim de que possa ter o conjunto necessário para a formação da culpa. Ou melhor, sua marcha segue piamente o princípio da indisponibilidade, constituindo-se, dessa forma, como garantia a efetiva solução dos conflitos ao circunscrever as delimitações temporais da norma substantiva (Código Penal), ou seja, prazos prescricionais. Tendo em vista esse fator, os fatos instruídos no processo criminal introduzem a noção de equilíbrio entre a satisfação social, fornecida pela imposição de um procedimento processual, e o respeito à dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da Carta Magna de 1988 (art. 1º, inciso III).

Vislumbrando esse perímetro, entendemos por bem, em uma apertada síntese, discorrer sobre o tema O moderno processo penal X A ineficiência na prestação jurisdicional, percutindo a partir de pesquisas do Supremo Tribunal Federal do Brasil sobre a morosidade da Justiça, as dificuldades de acesso a via jurisdicional e o papel da Defensoria Pública, a falta de um prazo razoável para a solução dos litígios e ainda algumas reflexões a respeito do moderno processo penal (processo garantista).

 

I. O MODERNO PROCESSO PENAL X A INEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
 

O tempo de espera (morosidade) por um provimento judicial é um dos maiores entraves da Justiça, segundo o próprio Presidente do Superior Tribunal de Justiça[11]. Com isso milhões de pessoas são relegadas há vários anos de sofrimento sem nenhuma perspectiva para a sua causa. Atrelado a isso, vemos procedimentos ultrapassados como o Protesto por Novo Júri[12] e o infindável número de recursos, principalmente manejados pelo Estado, apesar dos filtros de admissibilidade dos órgãos superiores.

Dessa maneira resta evidente para a comunidade jurídica, com lastro na pesquisa realizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que o Estado é o maior recorrente em causas na Justiça e também o maior devedor, cerca de 80% delas[13], atravancando de forma estarrecedora a tão enrijecida Justiça. Com isso, a conclusão a que chegamos é a de que o Estado é incongruente por exigir a penalização[14] da sociedade enquanto avulta os excelsos pretórios e as instâncias ordinárias com questões singelas do ponto de vista financeiro.

A pesquisa revelou[15] que o investimento na informatização da Justiça Estadual corresponde a 2,58% dos custos dos Tribunais estaduais; que os Tribunais Estaduais consomem em média 1,05% do PIB estadual, enquanto 4,99% é o impacto do custo da Justiça comum sobre a despesa pública estadual; mostrou que existem 6,63 magistrados para cada 100.000 habitantes; que a taxa média de congestionamento na Justiça de 1º grau é da ordem de 75,45%, na 2ª instância o índice cai para 57% e nos Juizados Especiais Estaduais, o índice é de 48,73%. Isto revela o seriíssimo problema da falta de investimentos com pessoal e em equipamentos para acelerar a prestação judicial que, inevitavelmente, culmina no congestionamento assinalado e no desprestígio da Justiça.

Sobre o assunto destacamos as respostas do Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Min. Edson Vidigal, em entrevista concedida ao Jornal da Tarde sobre morosidade na Justiça[16]:

 

Não é lenta (a Justiça) porque falte planejamento, apenas. É lenta porque a nossa cultura ainda é da morosidade. [...] A Justiça é lenta porque ela trabalha em cima de uma legislação que mais premia a procrastinação, de modo a facilitar a vida, por exemplo, dos maiorais de um Estado, que sempre têm direito a prazo em dobro, enquanto o cidadão, tem direito a prazo seco. Aqueles que podem contratar os melhores advogados também levam vantagem porque a legislação facilita muitos recursos. A Justiça é lenta porque nós temos processos demais e juízes de menos.

 

Tais correlações não se resumem as falhas procedimentais, processuais ou recursais, remontando essencialmente as profundezas do acesso à justiça, a única forma dos menos favorecidos clamarem por seus direitos. A inobservância deste princípio motriz do Estado Democrático de Direito, a longa marcha processual e as falhas do sistema, denotam que o tempo passou a ser tido como a neutralização do princípio da inocência. E, dessa forma, a parte é submetida a várias delongas, especialmente no processo penal, o que influi diretamente na aplicação da pena.

Por esta análise exsurge alguns questionamentos substanciais – qual a verdadeira fonte da força do direito? A sanção é a única forma de sujeição do particular ao regramento legal?

 

I.I. As dificuldades de acesso à justiça e o papel da Defensoria Pública
 

Hoje em dia, o acesso à justiça é um dos temas mais debatidos no país, fruto da sua relevância para o acesso dos desfavorecidos à tutela jurisdicional (Lei 1060/50, com as alterações da Lei 7510/86). Nesse aspecto de “socialiazação da Justiça” a assistência judiciária sempre foi um dos entraves do acesso à Justiça, fato que peremptoriamente vêem sendo discutido no curso da História. O limiar desta concepção reside no Código do Rei Hamurabi, cujo reinado prosperou entre 2.067 e 2.025 a.C. e, a par com isso, os demais códigos que o sucederam pelo mundo foram lentamente disponibilizando o auxílio gratuito do ente estatal para a tutela dos interesses de qualquer pessoa. A garantia do acesso à justiça, hoje respaldada constitucionalmente, inspirou-se na idéia da igualdade formal de todos perante a Lei e o Poder Judiciário. Daí decorre a criação de um órgão para a defesa dos necessitados - A Defensoria Pública[17] - definitivamente inserida como um ente essencial a Justiça no art. 134 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[18], organização pela Lei Complementar nº 80/1994, cujas funções já haviam sido dispostas na Emenda Constitucional nº 37/1987.

No Estado de Mato Grosso, para o nosso pesar, o órgão incumbido constitucionalmente de albergar os excluídos sociais (Defensoria Pública), vem sendo profligado duramente com a redução de sua dotação orçamentária e se não bastasse isso ainda arde sob o sentimento de incompreensão social. Essa incompreensão decorreu em ataque sofrido nas suas bases para que o diminuto quadro funcional de Defensores Públicos fosse ainda mais reduzido. Todavia, a sapiência dos membros da excelsa corte constitucional pairou sobre a terra de Dom Aquino e essa Injustiça jamais será feita. A conseqüência imediata desses ataques é a desconfiança da Justiça; ainda mais porque os atrasos na assistência jurídica majoram o expediente laboral dos Defensores, cominando com o retardo na prestação jurisdicional, fator pernicioso para o equilíbrio social. Sobre esse entendimento descrevemos às lições de Boaventura de Sousa Santos[19]:

 

Dois fatores parecem explicar esta desconfiança ou esta resignação por um lado, experiências anteriores com a justiça de que resultou uma alienação em relação ao mundo jurídico (uma reação compreensível à luz dos estudos que revelam ser grande a diferença de qualidade entre os serviços advocatícios prestados ás classes de maiores recursos e os prestados às classes de menores recursos); por outro lado, uma situação geral de dependência e de insegurança que produz o temor de represálias se recorrer aos tribunais. Em terceiro e último lugar, verifica-se que o reconhecimento do problema como problema jurídico e o desejo de recorrer aos tribunais para o resolver não são suficientes para que a iniciativa seja de fato tomada. Quanto mais baixo é o estrato sócio-econômico do cidadão menos provável é que conheça advogado ou que tenha amigos que conheçam advogados, menos provável é que saiba onde, como e quando pode contactar o advogado e maior é a distância geográfica entre o lugar onde vive ou trabalha e a zona da cidade onde se encontram os escritórios de advocacia e os tribunais. (grifo nosso)

 

Prosseguindo, a Defensoria Pública proporciona o acesso de 80% da população brasileira ao Poder Judiciário, segundo informações do Defensor Público Roberto Freitas[20], e em termos de autonomia para o exercício de suas atividades ultrapassa os Estados Unidos, por exercer livremente suas funções sem nenhum vínculo hierárquico com qualquer órgão do Poder Judiciário; é considerado como órgão constitucional autônomo e na mesma paridade com o Ministério Público; possui convênios com os Países Baixos, Suíça, Argentina, Paraguai através da reciprocidade de assistência jurídica gratuita, fatores que qualificam a importância da instituição.

Não obstante a sua importância, as suas dificuldades enquanto instituição, constitui seu principal óbice para o esplendor do acesso ao Judiciário a 80% da população brasileira. Destacamos que as principais dificuldades são as seguintes: falta de recursos, a falta de informações, a desconfiança na Justiça e as dificuldades processuais, explicitadas abaixo.

A falta de recursos dificulta as atividades de atendimento aos necessitados, o que conseqüentemente retarda o atendimento jurisdicional, como observa a d. Defensora Pública do Distrito Federal Mônica Tardivo[21]

 

99% das ações são feitas nas casas dos estagiários com os seus computadores. Esse computador na minha mesa é meu. Aí os estagiários trazem para o defensor corrigir o que está errado ou até fazer de novo, aí entra com a ação. O atendimento inicial é do estagiário. [...] A Defensoria não tem autonomia ou recursos próprios a nível financeiro. Então, ela depende de terceiros. Temos quatro resmas de folha por mês. Não dá para nada. Os defensores fazem uma vaquinha para comprar mais. Não temos nem acesso à Internet. (grifo nosso)

 

A falta de informação e de conhecimentos jurídicos sobre direitos básicos é uma barreira na relação do Defensor e seu cliente, o que dificulta a plena interação entre cliente/defensor, podendo causar um retardamento na solução das pretensões judiciais, como assinala Augusto Tavares Rosa Marcacini[22]:

 

[...] a falta de recursos vem, muitas vezes, acompanhada da falta de informação, o acesso à justiça é obstado até mesmo pelo fato do pobre desconhecer que tenha direito a pleitear, ou que possa ter sucesso na tarefa de lutar por seus direitos. As barreiras culturais são, na verdade, mais difíceis de serem vencidas do que as barreiras econômicas. Estas podem ser afastadas isentando-se o carente das despesas com o processo e fornecendo-lhe gratuitamente um advogado para patrocinar seus interesses. (grifo nosso)

 

A desconfiança na justiça tem contribuído para que as pessoas não busquem seus direitos. Isso decorre da má prestação dos serviços públicos pelo Estado que injeta nos seus clientes (sociedade) a predisposição a comparar com carga depreciativa e, inclusive, desconfiar ou não acreditar que no seu caso particular será feita justiça; i.e., o instinto de um animal preso em uma jaula revela que se as grades forem eletrocutadas, ele até por questão de sobrevivência ou até por lógica, após algumas tentativas, verifica que a única alternativa é não mexer nas grades da jaula. Sobre o assunto o Dr. José Renato Nalini[23], em pesquisa intitulada Diagnóstico do atual nível de informação sobre o Poder Judiciário na rede pública estadual descobriu que:

 

Apurou a pesquisa que 60% dos estudantes ouvidos afirmam que a Constituição não é cumprida e 24% acreditam que o cumprimento dá-se apenas parcialmente; 25% dizem que as leis no Brasil não são levadas a sério; 50% estão inseguros quanto á capacidade da Justiça em punir os infratores da lei; 47% dos que ressaltam a total ou parcial ineficiência do Poder Judiciário, a maior parte a atribui à corrupção dos juizes e á incorreta aplicação da lei. Já os professores opinam da seguinte forma: 71% duvidam que os responsáveis pelo Poder Judiciário desempenhem de forma correta a sua função. Desses, 27% atribuem o fato à corrupção. Dos alunos que não acreditam ou acreditam em parte nas leis, 55% afirmam que a justiça privilegia os ricos e 23% não sabem quem são os beneficiários. (grifo nosso)

 

As dificuldades processuais advindas dos muitos recursos cabíveis nos processos, as ditas brechas da legislação, dificultam a celeridade processual, proporcionando um tempo médio de três anos de duração dos processos na Justiça Comum, causando incalculáveis prejuízos às partes que necessitam da solução rápida para os seus conflitos, ou seja, “a justiça tardia, prejudica especialmente os pobres, para os quais a longa espera traz prejuízos irreparáveis”.[24]

Os fatores supra-assinalados (a falta de recursos, falta de informações, a desconfiança na justiça e as dificuldades processuais) são os principais entraves para o estandarte da Defensoria Pública.

Além desses fatores, elencamos outros conceitos sociológicos que compõem o acervo íntimo de cada desfavorecido ao pleitear seus direitos. São eles o de classe social, prestígio e autoridade, consecutivamente:

[...] as classes sociais são grupamentos particulares de fato e a distância, caracterizados por sua suprafuncionalidade, sua tendência para uma estruturação crescente, sua resistência à penetração pela sociedade global e por sua incompatibilidade radical com as outras classes[25]. Uma classe social nunca é definida somente por sua situação numa estrutura social, isto é, pelas relações que elas mantêm objetivamente com as outras classes sociais; ela deve também muitas de suas propriedades ao fato de que os indivíduos que a compõem entram deliberadamente ou objetivamente em relações simbólicas que, expressando as diferenças de situação e de posição segundo uma lógica sistemática, tendem a transmutá-las em distinções significantes[26]. Prestígio é um sentimento através do qual algumas pessoas são admiradas, apreciadas, olhadas com inveja, enquanto outras são tratadas como se fossem ninguém. Essa ordenação das pessoas em superiores ou inferiores expressa-se através da interação social[27]. A autoridade é um direito institucionalmente reconhecido de influenciar as ações de outros, a despeito de suas atitudes pessoais imediatas em direção á influência [...] uma pessoa possui poder somente na medida em que sua habilidade pode influenciar outros e sua habilidade para alcançar ou garantir as posses não estão sancionadas institucionalmente. [...] Além disso, o poder pode ser, e geralmente o é, usado para adquirir status e símbolos de reconhecimento legitimados[28]. (grifo nosso)

 

Dentro dessa perspectiva, podemos destacar inúmeros trabalhos atinentes ao acesso à justiça que desembocam na grande ferida social mais perniciosa e proeminente – a desproporção de renda no país –, que reproduz o inchaço social nas áreas circundantes (favelas) das grandes cidades. E, assistindo a esse prisma, podemos identificar o choque entre a justiça social x igualdade jurídica para o resplendor da sociedade.

A partir disso, merece aplausos a explanação de Boaventura de Souza Santos quando demonstra que os critérios de desigualdade no acesso a justiça devem ser vistos de acordo com a condição econômica, social e cultural dos agentes/clientes nos autos. Nesse turno e, pela imprescindibilidade do assunto, registro a delineação do autor quanto ao fator econômico:

 

Muito em geral pode dizer-se que os resultados desta investigação permitiram concluir que eram de três tipos esses obstáculos: econômicos, sociais e culturais. Quanto aos obstáculos econômicos, verificou-se que, nas sociedades capitalistas em geral, os custos da litigação eram muito elevados e que a relação entre o valor da causa e o custo da sua litigação aumentava à medida que baixava o valor da causa. [...] É que são eles fundamentalmente os protagonistas e os interessados nas ações de menor valor e é nessas ações que a justiça é proporcionalmente mais cara, o que configura um fenômeno da dupla vitimação das classes populares face à administração da justiça.[29] (grifo nosso)

 

Complementando as correlações acima, Sérgio Adorno dimana que a satisfação social não está limitada à ampliação do número de servidores da justiça, mas sim em um trabalho sacramental de conscientização sobre o significado do direito, sua interpretação e aplicação diante e perante a sociedade, maior interessado na estabilidade social por meio da qual a pacificação é a solução. Melhor dizendo, “a problemática do acesso das classes populares à justiça não se resolve apenas com a ampliação física dos serviços da justiça, mas exige, progressivamente, alterações no modo de encarar a função judiciária e o próprio direito”.[30] (grifo nosso)

Nesse diapasão, os estudos sobre o perfil dos condenados e absolvidos em processos criminais no Município de São Paulo entre 1984/1988 revelam que a maior dificuldade ou desconfiança deles advinha da burocracia e do excesso de formalismo dos códigos, concebendo de forma direta que a “consciência é o reflexo no indivíduo das sanções da sociedade”[31]. (grifo nosso) Dentre elas as sanções negativas organizadas, procedimentos definidos e reconhecidos para pessoas cuja conduta é passível de desaprovação social, como bem analisa Radcliffe-Brown:

 

Num exame das funções das sanções sociais o mais importante não são os efeitos da sanção sobre a pessoa a quem se aplica, mas os efeitos gerais dentro da comunidade que aplica as sanções. [...] A função da sanção é restaurar a euforia social ao oferecer expressão coletiva definida aos sentimentos que foram afetadas pelo feito, [...] As sanções são assim de primordial importância para a sociologia, na medida em que são reações por parte da comunidade a fatos que afetem sua integração[32]. (grifo nosso)


I.II A ausência de um prazo razoável para o deslinde dos litígios

 

Esse prolongamento da marcha processual traz consigo dois problemas. A uma, a falta de definição sobre a relação material prejudica os fins substantivos do direito subjetivo, tornando-se um obstáculo para que a paz jurídica esperada com a sentença seja alcançada ou estabelecida. A duas, o direito fundamental do imputado de ser julgado em um prazo razoável é mitigado pela excessiva duração do processo.

Vemos com isso que “uma justiça lenta[33] é uma justiça negada” ou a falta de justiça constitui-se em uma verdadeira injustiça. “O processo penal, por conseguinte, é em sua essência um juízo, mas se é chamado de processo é cabalmente para dar a entender que o juízo procede, ou deve proceder, ou não pelo menos proceder com cautela”.[34]

Do direito comparado extraímos alguns estudos de Carlo Guarnieri[35] sobre a duração dos processos nos países europeus, principalmente dos que adotam o modelo greco-romano. “Na Itália, o tempo médio de duração de um processo é estimado de 09 a 13 meses, na Alemanha de 3,9 a 5,1 meses e na França de 07 a 09 meses”[36]. Na Itália, por exemplo, de onde importamos nossos Códigos Penal e Processual Penal, 48% (quarenta e oito por cento) dos imputados são privados de sua liberdade por meio da prisão preventiva, tornando-se evidente, sem mensurar os números nacionais, a crise de legitimidade dos direitos fundamentais dos presos e do direito penal como um todo.

Revela-se o pleno desrespeito a liberdade como preceito puro e mais básico das cartas constitucionais e tratados internacionais de proteção aos direitos humanos. Assentou-se nos países grafados e no Brasil uma “tradição” de prisão, em primazia as cautelares, como o único remédio jurídico e social manejado para a diminuição da violência. É visível, por tanto, que a pirâmide hierárquica da Constituição foi invertida, uma vez que a prisão, até então exceção passou a ter primazia sobre o direito pleno à liberdade.

Nesse assombro, nos deparamos ainda com o excesso de tempo para o julgamento de um processo no país, revivendo a cada dia o brocardo de que “o tempo é o mais velho entrave para que se faça Justiça”.

Essas antinomias jurídicas denotam o total desrespeito aos princípios básicos da dignidade da pessoa humana, presunção da inocência, sem falar na inafastabilidade e celeridade processual.

O processo penal trata-se “de um caminhar, de um percorrer um longo caminho, cuja meta parece assinalada por um ato solene, com o qual o juiz declara a certeza, [...] ou que o imputado é culpado ou que o imputado é inocente”.[37]

Com efeito, o delito tem sua temporalidade mitigada (instantânea ou prolongada, sendo normalmente descobertos), já a pena tem o fator temporal como sua ameaça. O delito e o castigo devem ser apontados como fatores primordiais para o restabelecimento da ordem pública, desde que, observado piamente os princípios da razoabilidade processual. Por essa fórmula, rechaçamos as opiniões do senso comum de que um processo demora por causa do juiz, do delegado ou do promotor. O processo tem uma marcha que, por vezes, é alongada, de acordo com a complexidade da causa[38], vejamos os apontamentos de Carnelutti[39] sobre o assunto:

Quando ouvimos dizer que a justiça deve ser rápida, temos aí uma fórmula que se deve tomar com benefício de inventário; o clisé dos chamados, que prometem a toda discussão do balanço da justiça que esta terá um desenvolvimento rápido e seguro, mostra um problema ao da quadratura do círculo. Infelizmente, a justiça, se é segura não é rápida, e se é rápida não é segura. É preciso ter a coragem de dizer, por sua vez, também do processo: quem vai devagar, vai bem e vai longe. Esta verdade transcende, inclusive, da própria palavra “processo”, a qual alude a um desenvolvimento gradual no tempo: proceder, quer dizer, aproximadamente, dar um passo depois do outro [...] são as primeiras dificuldades pelas quais o castigo, infelizmente, não pode ser rápido, como o é o delito. (grifo nosso)

 

No mesmo norte, do curso da história jurídica percebemos que o processo tinha per se a celeridade processual como fundamento, como a seguir demonstrado.

Na época do rei romano Constantino “o tempo médio de duração do processo era de um ano entre a figuração de um litisconsórcio, se houver, e a decisão de mérito’[40]. Posteriormente no reinado de Justiniano e alguns séculos mais tarde no reinado de Alfonso X tal meta” passou para dois anos”[41] e, com os anos, o tempo padece a expectativa do jurisdicionado, mormente pelas causas “naturais” de dificuldades de acesso à justiça. Além do mais após os anos da marcha processual a condenação não tem o mesmo rumo de punição, mas sim de um castigo protelado no tempo. O castigo para ser eficiente deve impingido em um período próximo à prática do crime, sob pena da diluição da pena no tempo de tramitação do processo.

Na mesma digressão há muitos questionamentos da doutrina, inclusive dos literários. Acentua o Marques de Beccaria[42] que “a pena será mais justa quanto mais próxima estiver da data dos fatos”, além dele Shakespeare, em sua obra Hamlet, enfoca que “a lentidão dos tribunais está entre as causas que podem aniquilar um homem”[43]. Direciona Franz Kafka, no livro O Processo[44], que por vezes “as pessoas sequer tem conhecimento do que estão sendo processado e quiçá saberão do prazo de aguardo da decisão meritória”.

Do mesmo modo, após assente cobrança social, a Comunidade Européia passou a legislar sobre a celeridade processual. Prefacialmente foi redigida a 6ª emenda da União Européia dispondo que em todos os juízos penais o acusado gozará de direito a um processo rápido. Além dela, cotejamos a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, em seu art. XXV (todo indivíduo que tenha sido privado de sua liberdade tem direito [...] a ser julgado sem dilação injustificada), a Convenção Européia para Proteção dos Direitos Humanos e das liberdades fundamentais (1950- CEDH) em seu art. 6.1, as decisões da Suprema Corte da Alemanha (Bundesgerichsthof) a partir de 1966. Na América do Sul, a Corte Argentina em 1966, no caso “Mattei” inspirou precedente jurisprudencial pela necessidade de aplicação da Lei Penal no menor tempo possível, do qual transcrevemos algumas linhas:

Toda pessoa tem direito a que sua causa seja ouvida de maneira eqüitativa, publicamente e em um prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, que decidirá sobre os direitos e obrigações de caráter civil, ou bem sobre o fundamento de toda acusação penal dirigida contra esta.[45]

 

Outro caso de destaque foi a condenação da Espanha pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), no caso Gonzalez-Dória Duran de Quiroga, ao pagamento de 10.000 euros para compensar o excesso de prazo para o deslinde processual[46].

Após esta análise, Pastor conclui sinteticamente a significação de prazo razoável:

 

1. O prazo razoável de duração do processo penal não é um prazo em sentido processual penal que deve ser previsto abstratamente pela lei, sem que se trate de uma pauta interpretativa aberta para estimar se a duração total de um processo foi ou não razoável, para o qual deve-se proceder caso a caso, uma vez finalizado o processo e globalmente, levando em conta a complexidade do caso, a sua gravidade, as dificuldades probatórias, a atitude do imputado e o comportamento das autoridades encarregadas da persecução penal. 2. Comprovada a falta de razoabilidade na duração, a violação do direito deve ser compensada desde o ponto de vista material, penal ou civil, ou dar lugar a sanções administrativas, penais ou disciplinares, e somente em casos extremos se justifica o sobrestamento.[47] (tradução nossa).

 

Nesse acervo é pacífico que “a única forma para dissipar questionamento sobre o curso do processo penal é o imperativo da Lei – nulla coactio sine lege, pelo menos para os positivistas”[48]. A afirmação é feita por se tratar de direitos indisponíveis, mas principalmente pela peleja com a liberdade alheia (direitos individuais) e pela prevalência do interesse público de punir. Daí surge a seguinte indagação: Ainda é aplicável a nossa realidade os prazos prescricionais do Código Penal?

Modestamente defendemos que com o ligeiro aumento na quantidade de anos necessária para o fim do processo, a tabela do art. 109 e segs do CP estaria desatualizada. Reforçamos a premissa pelo fato de estar à disposição das partes uma infinidade de recursos, seja para se buscar Justiça ou para procrastinar infinitamente o feito. De outra banda, pela falta de legislação adequada, a jurisprudência teve de socorrer os presos, até então enclausurados sem posição sobre o cumprimento régio de prazos, deixando-se a função precípua do Judiciário (aplicar a lei) para definir procedimentos de historicização da norma a realidade contemporânea.

No mesmo curso, a fixação de um prazo razoável para o processo torna mais segura a estada nos autos, sujeitando-se a omissão o império das indenizações. Todavia, isso não é aplicado. O processo acaba terminando sem que ninguém tenha o cuidado em perquirir se o imputado perdeu o animus do crime ou está em vias de perdê-lo.

Caso pensássemos somente nessa afirmação, bastaria a leitura o inciso LXXVII, do art. 5º sobre o dever do Estado de indenizar os prejuízos causados ao particular, primordialmente pela nova orientação constitucional trazida pela Emenda Constitucional (E.C.) 45/2004, que introduziu o princípio da celeridade processual como direito individual fundamental de todo acusado, seja em processo administrativo ou judicial, a respeito do qual esperamos sua frutificação.

Para isso acoplamos ao texto o significado de prazo como um conjunto de atos, uma etapa do procedimento ou todo o processo, estabelecido em unidades temporais, históricas e sociais, justificadas pela necessária dimensão da extreme coação a que o particular está sujeito com a intervenção do Estado. Caso sejam desrespeitados, sobrepõem, em demasia, a ilegitimidade da punição estatal, exceto por algumas complexidades ou peculiaridades processuais (ex. número grande de réus, testemunhas residentes em outras comarcas etc).

 

I.III O moderno processo penal
 
Através dos tempos, principalmente dos ensinamentos sociológicos e filosóficos, aprendemos que o homem é um ser social que não pode sobreviver longe da sociedade, tendo em vista a sua natureza e afirmação no conjunto, aglomerado, o que reforça os seus deveres no papel social.

Com isso, a corrente moderna do processo penal teve de se preocupar com a dissipação da antiga junção dos pressupostos processuais civis e penais. A diferença é gritante, uma vez que o simples conhecimento de que aquela trata de interesses divisíveis, em sua maioria, e esta de interesses indivisíveis, demonstra que os institutos devem ser aplicados de forma diferente.

Além disso, no processo penal, a parte não sofre os efeitos da revelia, a confissão não pode ser tida como a única prova dos autos, sob pena de absolvição, os prazos processuais são mais enxutos, a infinidade de recursos (apelação, sentido estrito, agravo etc) e ações constitucionais (Mandado de Segurança, Habeas Corpus, etc) para albergar os acusados, tudo isto circundado por normas da década de 40 do séc. XX (CPP e CP).

A evolução das escolas penais traz consigo a evolução da pena, utilizando-se como paradigma atual o Direito Penal Mínimo (processo garantista), para punir os crimes com acervo destrutivo ou verdadeiramente destoante das imposições da realidade vigente. Inicialmente o Estado avocou para si o direito de punir extirpando a vingança particular, deslocando-a para um ente ficto (Estado) e acima dos envolvidos. A partir daí, a estrutura estatal foi se expandindo para palacetes e obras de grande vulto, deixando para trás a prestação de contas com seu principal credor – a sociedade –, principal motivo para as modestas modificações na maneira de tratamento dos relegados da justiça.

Coadunamos da célebre tese de Roxin de que a pena deve ser imposta tão somente por um processo, assegurando-se o devido processo legal e, se necessário, impondo-se a pena (retribuição, prevenção especial e prevenção geral). A idéia de prevenção geral decorre da proteção dos bens jurídicos da coletividade, a prevenção especial na individualização da pena e a retribuição na dosimetria da culpabilidade do agente e o quantum da infringência da tranqüilidade dos seus pares.

Já a instrumentalidade do processo penal deve ser vista como a aplicação do princípio de justiça e da dignidade da pessoa humana, fazendo com que a norma absorva o caráter impositivo ou proibitivo de certas liberdades do indivíduo durante sua estadia no público, por ser indispensável para a afirmação do “modelo escravocrata” do trabalho para fortalecer o capital.

As formas de instrumentalidade podem ser subdivididas em negativas e positivas, segundo as notas de Cândido Rangel Dinamarco:

 

A instrumentalidade negativa corresponde à negação do processo como um fim em si mesmo e significa um repúdio aos exageros processualísticos e ao excessivo aperfeiçoamento das formas (instrumentalidade das formas, com relevantíssimas conseqüências no sistema de nulidades). A instrumentalidade positiva está caracterizada pela preocupação em extrair do processo (como instrumento) o máximo proveito quanto à obtenção dos resultados propostos e confunde-se com a problemática acerca da efetividade do processo, de modo que ele deverá cumprir integralmente toda a função social, política e jurídica. São quatro os aspectos fundamentais da efetividade: a) admissão em juízo; b) modo de ser do processo; c) justiça das decisões; d) utilidade das decisões[49].

 

Destas observações, resta evidente que o processo não é um todo em si mesmo, nunca foi e nunca será. Antes disso deve se amoldar ainda mais ao direito material, sob pena de tornar-se inócua qualquer proteção social e mínima a aplicação dos institutos jurídicos, lastreando-se maior importância ao procedimento adotado do que ao crime. Para que esta visão caolha não floresça basta nos atermos à instrumentalidade dos direitos e garantias individuais fundamentais do cidadão.

Tendo essa percepção, a instrumentalidade deve ser vista como a garantia da efetividade da norma, respeitando-se os direitos fundamentais de cada individuo. Goldschimdt analisa que “os direitos fundamentais, como tais, dirigem-se contra o Estado, e pertencem, por conseguinte, à seção que trata do amparo do indivíduo contra o Estado”[50].

No mesmo curso, os direitos fundamentais são tidos como direitos de defesa ou de liberdade[51] normas de proteção dos institutos jurídicos (da família, da herança, propriedade, mas principalmente da efetividade dos direitos individuais e sociais), garantias políticas do exercício das liberdades (implementar as formas de garantia, políticas da sociedade e do estado para assegurar não só o cumprimento da lei, mas sim a livre circulação) etc.

Nessa linha, somente concepções democráticas reais podem orientar o processo penal para a devida utilidade e efetividade. Mesmo assim, o nosso vasto acervo doutrinário, jurisprudencial e legislatório ainda não dissipou a insatisfação e a falta de segurança longe dos sistemas eletrônicos de nossos lares.

Daí o porquê da necessidade de cinco princípios básicos para explicitar o processo garantista:

 

1º Jurisdicionalidade - Nulla poena, nulla culpa sine iudicio: Não só como necessidade do processo penal, mas também em sentido amplo, como garantia orgânica da figura e do estatuto do juiz. Também representa a exclusividade do poder jurisdicional, direito ao juiz natural, independência da magistratura e exclusiva submissão à lei. 2º Inderrogabilidade do juízo: No sentido de infungibilidade e indeclinabilidade da jurisdição. 3º Separação das atividades de julgar e acusar - Nullum iudicium sine accusatione: Configura o Ministério Público como agente exclusivo da acusação, garantindo a imparcialidade do juiz e submetendo sua atuação a prévia invocação por meio da ação penal. Esse princípio também deve ser aplicado na fase pré-processual, abandonando o superado modelo de juiz de instrução. 4º Presunção de inocência: A garantia de que será mantido o estado de inocência até o trânsito em julgado da sentença condenatória implica diversas conseqüências no tratamento da parte passiva, inclusive na carga da prova (ônus da acusação) e na obrigatoriedade de que a constatação do delito e a aplicação da pena será por meio de um processo com todas as garantias e através de uma sentença. 5º Contradição - Nulla probatio sine defensione: É um método de confrontação da prova e comprovação da verdade, fundando-se não mais sobre um juízo potestativo, mas sobre o conflito, disciplinado e ritualizado, entre partes contrapostas: a acusação (expressão do interesse punitivo do Estado) e a defesa (expressão do interesse do acusado em ficar livre de acusações infundadas e imune a penas arbitrárias e desproporcionadas). Para o controle da contradição e de que existe prova suficiente para derrubar a presunção de inocência, também é fundamental o princípio da motivação de todas as decisões judiciais, pois só ele permite avaliar se a racionalidade da decisão predominou sobre o poder.

 

Com essas observações sobre o modelo garantista buscamos descrever ligeiramente a intenção de quebra do formalismo exacerbado que, por vezes, é a causa dos malefícios do processo. Não nos olvidando da visualização das mínimas garantias e direitos fundamentais para que efetivamente apreendamos, concretamente, a idéia de Justiça:

 

Devemos equilibrar na balança o formalismo e os direitos fundamentais do acusado, como medida de extrema urgência. Justamente para fornecer um remédio à carência do pensamento, serve a balança, e, para a carência da boa vontade, serve a espada. Aquela representa o animus e esta, o corpus do Direito.[52] (grifo nosso)

 

Ademais, apregoamos algumas críticas lançadas ao atual sistema penal brasileiro:

 

A influência do pensamento clássico que ainda sobrevive e insiste em permanecer na cultura jurídica brasileira tornou os instrumentos de realização do Direito Penal um formalismo inconcebível para a sociedade moderna. Nossa polícia judiciária, por exemplo, possui a estruturação legal dos tempos de Getúlio Vargas, com força inquisitiva, por meio do inquérito policial obsoleto, cujos depoimentos vão repetir-se de forma protelatória na fase judicial, graças à ausência do contraditório na fase investigatória. Faltando garantias constitucionais que retirem os policiais da influência político-partidária, a Polícia Civil acaba servindo como um verdadeiro filtro dos que devem ou não ser denunciados pelo Ministério Público. Exerce um controle sobre a criminalidade baixa, pouco realizando quando trata-se dos crimes contra a economia, a ordem tributária ou quando a atividade criminosa é proveniente de organização criminosa e lavagem de dinheiro, até mesmo por falta de estrutura para tanto. A Polícia Militar, em suas rondas ostensivas, igualmente controla a periferia, concede segurança aos bancos e ao comércio, sem desenvolver papel mais importante no combate à criminalidade da classe dominante, em que pese seus esforços na área florestal, na defesa do meio ambiente, mas sem estrutura para essas funções em um país de dimensões continentais. Os delegados de polícia, sem garantia constitucional da inamovibilidade, quando atuantes, estão sujeitos às pressões políticas e remoções indesejadas pelos agentes políticos que são prejudicados pelas investigações policiais. [...] O processo penal na fase judicial igualmente traz ranços do autoritarismo, com o desrespeito à dignidade da pessoa humana, por meio de inúmeras prisões cautelares sem necessidade, o interrogatório do réu sem a participação do advogado de defesa, o que é uma tragédia para os acusados mais pobres, contendo ainda a proibição para elaborarem-se reperguntas ao interrogando.[53]

 

Com efeito, nos resta iluminar essas notas com o peso do princípio da dignidade da pessoa humana, orientador dos princípios fundamentais da pessoa humana, verbis:

 

O princípio da dignidade da pessoa humana está na base do estatuto jurídico dos indivíduos e confere unidade de sentido ao conjunto dos preceitos relativos aos direitos fundamentais. Estes preceitos não se justificam isoladamente pela proteção de bens jurídicos avulsos, só ganham sentido enquanto ordem que manifesta o respeito pela unidade existencial de sentido que cada homem é para além de seus atos e atributos. E esse princípio da dignidade da pessoa humana há de ser interpretado como referido a cada pessoa (individual), a todas as pessoas sem discriminações (universal) e a cada homem como ser autônomo (livre). É evidente, assim, que a dignidade da pessoa humana funciona como suporte de todos os direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal. Como, portanto, entender que a privação não necessária da liberdade individual não signifique uma pena precipitada e, por isso, uma ofensa à dignidade da pessoa atingida e à todos aqueles que sofram o risco de serem também, indistinta e imotivadamente, alcançados pelo arbítrio?[54] (grifo nosso)

 

Assim, com o esmero da liberdade e da dignidade da pessoa humana acima do formalismo, dá-se ao processo penal a devida adequação, utilidade e efetividade necessárias à promoção da prestação jurisdicional. O cumprimento da marcha processual em prazo razoável deverá observar esses enunciados e, se por acaso não houver utilidade e interesse processual, porque não preenchidas as condições de ação, os pressupostos processuais, não há nenhum obstáculo que impeça o magistrado de julgar a causa.

O tempo jamais pode ser aplicado como pena para o acusado, exceto quando verdadeiramente provada a prática do ilícito. Não podemos mais conceber um Processo Penal que deixe para segundo plano a efetividade em homenagem às raízes fascistas do formalismo italiano, sobejamente imbricado na legislação penal e processual penal.

O processo deve ser uma arma para a punição dos criminosos e não o local de martírio dos inocentes. Para provar a inocência ou tentar diminuir o quantum da punição, os acusados são obrigados, muitas vezes, a cumprir antecipadamente a pena que, por vezes, não lhe era cabível. Nesse caso, o Estado deve ressarcir o cidadão pela sua falta, mas, como é cediço, o Estado mau paga os seus funcionários quiçá os injustiçados. Se os acusados são obrigados a cumprir antecipadamente a pena, porque não podem receber a prestação jurisdicional antecipadamente também? Não somos pródigos de pensar que essa máxima valha para todos os processos, haja vista a que, dependendo da complexidade da causa, torna-se temerário um julgamento precipitado antes mesmo da formulação de um juízo de valor (justa causa).

Devemos parar de pensar como dogmatossauros, segundo o saudoso constitucionalista mato-grossense Carlos Antônio de Almeida Melo, tendo a Lei acima de todas as coisas, mormente se tratarmos de uma Lei patrimonialista e escorada na doutrina fascista da década de quarenta do século passado. O direito é fruto da realidade social, por isso, com o passar dos anos devemos rever alguns posicionamentos para moldá-los às necessidades de hoje.

Se no processo civil (matéria disponível) Pontes de Miranda inovou com a criação da exceção de pré-executividade para proteger os devedores no processo de execução, que, frise-se, não está na Lei de ritos civil, porque no direito penal, cujos clientes são pessoas humildes, de pouca instrução (normalmente invisíveis para os olhos da sociedade), não podemos pensar na sua dinamização; aplicando o julgamento antecipado da lide para atropelar ações de pouca importância para o Direito, que de plano são um obstáculo para o trato de outras ações de interesse público (como homicídio, latrocínio, lavagem de dinheiro, estupro, etc), principalmente por não terem causado nenhum abalo na tranqüilidade social.

De todo o cotejo, finalizamos com as palavras do doutrinador Weber Martins Batista[55], in litteris:

Para condenar, que se esgotem todas as oportunidades de defesa; mas, para absolver, que se faça tão logo haja certeza plena. O interesse social na punição dos criminosos, um dos dois valores mais essenciais diante dos quais se move o processo, não sofre com a demora, se esta tende à certeza de culpa; mas cada dia a mais de inútil coação processual constitui punição injusta do inocente. (grifo nosso)

 

CONCLUSÃO
 

Atualmente, com as prateleiras das escrivanias abarrotadas de processos e a escassez de magistrados, alguns operadores do direito entendem necessária a aplicação, com a máxima urgência dos postulados da razoabilidade n condução do processo penal, posto que o prolongamento da marcha processual ao invés de benefícios à sociedade (pacificação de conflitos) trouxe sérios problemas para os acusados (a mingua da Lei e da sorte); causando, com isso, a repulsa e descrédito pela falta de eficácia do órgão Estado/Juiz.

Essa agremiação há muito tempo vêm sendo manejada por Promotores, Juizes de primeiro grau, advogados e até modestamente por alguns Tribunais como forma de satisfação social. Nesse sentir, a visão dos nossos tempos destoa totalmente da que conduzia a década de 40 do século passado, quando foi criada uma nova orientação de Direito Penal, uma vez que a quantidade de processos em curso era consideravelmente menor e proporcionava ao magistrado a oportunidade de apreciar com cautela a procedibilidade do pedido deduzido na inicial.

A necessidade do provimento judicial e as raias do devido processo legal ainda são os maiores cursores de um período de admoestação exagerada da norma. Esta, per se, deve ser analisada de acordo com o seu instrumento prático de efetivação (interpretação judicial), fazendo com que haja a devida historicização da Lei com a realidade fática. Se assim não fosse, estaríamos tergiversando por dois mundos intocáveis e imutáveis, ou seja, o mundo abstrato da norma e o mundo real, sendo que para que o abstrato possuía validade deverá estar regiamente adequado a situação posta à prova.

Por essas notas, nos debruçamos no berço da literatura para identificar um dos sentimentos mais perniciosos e atemorizadores do homem – o sentimento de angústia e de incerteza da vida humana pelos joguetes de forças desconhecidas –, introduzidos pelas célebres notas do imortal Dostoiéviski que, aos poucos, foram lapidadas pelo mestre Franz Kafka, do qual se irradiam as obras “O processo” e “Na Colônia Penal”, por retratarem a luta paradigmática das pessoas para compreender a repressão e repreensão do Estado por meio da acusação sob a condução de um tercius.

Tais fatores são os divisores d’água por revelarem na angústia interior do ser humano a incerteza sobre suas vidas, fadadas à dúvida existencial e a irresignação perspicaz do desconhecido, do motivo pelo qual estão sendo molestados pelo aparelho do Estado.

Para enaltecer a questão, imagine qual a repercussão na mente de uma pessoa acusada do cometimento de um crime, que, ao longo dos anos, não sabe o direcionamento da sua questão (se cometeu ou não a infração e a sua punição), e continua vivendo o dia numa verdadeira sina pela busca da terra perdida da satisfação dos seus direitos/deveres como cidadão. Com isso as profundezas da mente do acusado serão lançada para algum objetivo banal, como um cavaleiro andante, aos moldes de Dom Quixote de la mancha, em que a persistência sagaz é o seu único remédio para despistar a tristeza interior de não saber o seu destino. Embora seja valente e destemido dentre seus pares, é inseguro e infeliz por não saber ao certo a que rumo será levado, como muitos por ai, levados por qualquer motivo ao mundo do crime e que, muitas vezes, acabam enrolados nessa senda até os fins de seus dias.

Abeberando dessa idéia temos que a aplicação do moderno processo penal sob o prisma da condução mais racional e humanitária dos processos judiciais deve ser visto como algo eminentemente funcional pelos magistrados e demais operadores do direito, conglobada com o mundo exterior a norma, partindo das idéias do neokantismo, dos ideais de Claus Roxin, Günther, para mantermos atualizada a norma em resposta aos anseios sociais; ou melhor, a manutenção de um direito penal mínimo sobre a ferocidade e velocidade dirimente das questões criminais.

Para salientar a discussão, como exemplo dos casos que não devem permear nosso ordenamento jurídico, cito o Reexame Necessário de Decisão (Recurso Ex-Officio) nº 45182/04, julgado pelo TJMT em 04/01/2005, do qual o réu foi denunciado em 1982 por incurso nas sanções do artigo 121, caput, do CP, cuja resposta final ocorreu ano passado. Ou seja, transcorreram-se 22 (vinte e dois) anos, entre a data do recebimento da denúncia e a decisão colegiada que manteve a decisão absolutória de primeiro grau.

Dee outro lado, a inovação constitucional de 2004 (E.C. nº 45), percebemos a preocupação impecável em se prevenir o devanir nos processos, de forma a coroar a celeridade e a aplicação do Direito, conforme artigo 5º, inciso LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (grifo nosso).

Por isso, perfilhamos a idéia de que a celeridade do julgador inibirá discursos pela impunidade e descrédito do Judiciário, reproduzindo, pelo menos em tese, a satisfação social com a resposta ao acusado pelo juízo.

 

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Notas:

 

[1] Sobre o tema, nos filiamos a corrente liderada pelos Drs. Antônio Augusto Cançado Trindade (dentre sua obras – A incorporação das normas internacionais de proteção dos direitos humanos no direito brasileiro. 2. ed. San José. C.R: Instituto Interamericano de Direitos Humanos. Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Alto Comissariado das Nações Unidas para os refugiados. Comissão da União Européia e Governo da Suécia, 1997) e Silvia Piovesan (na obra Direitos Humanos e o Direito Internacional Constitucional. 3. ed. Max Limonad, 1996) que atêm os tratados internacionais de direitos humanos, ratificados pelo Brasil, como norma de cunho constitucional pela permissiva do § 2º, artigo 5º, da CRFB/88. De forma diversa, a outra corrente perfilhada pelo STF interpreta e acolhe os tratados internacionais de direitos humanos como legislação ordinária (RTJ nº 83/809, 70/333, 100/1030, RT 554/434, ADIN 1430/DF). Porém, com o advento da Reforma do Poder Judiciário EC (emenda constitucional) nº 45, a interpretação dos tratados internacionais de Direitos Humanos irá se subsumir nesse sentido: art. 5º, § 3º, da CRFB/88 – Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (grifo nosso)

[2] A vingança privada foi mitigada da seara social no Egito Antigo e no Código-matriz do Rei Hammurabi (cerca de 1694 a.C.), sendo definitivamente extirpada pelo direito greco-romano que desconstituiu a idéia de que os homens poderiam matar seus semelhantes por brigas ou dívidas. Sobre isso, alertamos ser defeso aos romanos chacinar seus semelhantes (cidadãos romanos), exceto em situações excepcionais de guerra. Porém, lhes era permissível praticar a vingança privada contra estrangeiros, escravos, suas esposas e filhos (no caso de Esparta e outras cidades militares) por serem considerados como coisa e meio de produção. Por isso, com propriedade, abebero das lições do mestre romano Ulpianus de que a justiça é a vontade constante e perpétua de atribuir a cada um o seu. Os preceitos do direito são os seguintes: viver honestamente, não prejudicar outrem, atribuir a cada um o seu. A jurisprudência é a ciência do justo e do injusto, baseada num conhecimento das coisas divinas e humanas. (grifo nosso)

[3] HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da Filosofia do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000. pp. 185, 196 e 214.

[4] Correlacionado ao tema, colho as lições do mestre Kazuo Watanabe, citado por Ruy Pereira Barbosa, para quem o direito de acesso à justiça é, fundamentalmente, o direito de acesso à ordem jurídica justa; são dados elementares desse direito: 1) o direito à informação e perfeito conhecimento o direito substancial e à organização de pesquisa permanente a cargo de especialistas e orientada à aferição constante da adequação entre a ordem jurídica e a realidade sócio-econômica do país; [...] 3) direito à preordenação dos instrumentos processuais capazes de promover a efetiva tutela de direitos; 4) direito à remoção de todos os obstáculos que se anteponham ao acesso efetivo à justiça com tais características. (BARBOSA, Ruy Pereira. Assistência Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1998).

[5] SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice. São Paulo: Cortez, 1995. p. 168. Corrobora a questão o mestre Mauro Capeletti ao dispor que o obstáculo econômico – por este, grande é a porcentagem de pessoas que não tem acesso à justiça em razão de sua pobreza material; o obstáculo organizador – através deste, certos direitos ou interesses ‘coletivos’ ou ‘difusos’ não são tutelados eficazmente se não houver uma radical transformação de regras e instituições tradicionais de direito processual; o obstáculo propriamente processual – por meio da qual certos tipos tradicionais de procedimentos são inadequados aos seus deveres de tutela. (Mauro Capeletti apud BARBOSA, Ruy Pereira. Assistência Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1998).

[6] ADORNO, Sérgio. Crime, justiça penal e desigualdade jurídica. As mortes que se contam no tribunal do júri. In SOUTO, Cláudio & FALCÃO, Joaquim. Sociologia & Direito. São Paulo: Pioneira, 1999. p. 327.

[7] RADCLIFFE-BROWN, A.R. Estrutura e função na sociedade primitiva. Petrópolis: Vozes, 1973. p. 253.

[8] Idem, ibidem.

[9] RADCLIFFE-BROWN, A.R. Op. cit. p. 259.

[10] BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. São Paulo: Difel, 1989. p. 223.

[11] Entrevista concedida pelo Presidente do Colendo Superior Tribunal de Justiça ao Jornal da Tarde em 24 de abril de 2005. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 06 jul. 2005.

[12] O Protesto por Novo Júri é um dos últimos resquícios da colonização portuguesa (das Ordenações Filipinas, Afonsinas e Joaninas) na nossa legislação penal, foi inicialmente manejada para que a parte pudesse suplicar ao rei para não ser morto. Tal procedimento é totalmente ultrapassado pela amplitude (devolutividade e suspensão da matéria julgada em primeiro grau) do recurso de apelação e pela atual e corriqueira inaplicabilidade pelos magistrados de pena igual ou superior a 20 anos, exceto para grandes barbáries, tempo mínimo de pena fixado para possibilitar ao condenado o cabimento do Protesto.

[13] Pesquisa encomendada pelo Supremo Tribunal Federal, apresentada no seminário “A Justiça em números”. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 06 jul. 2005.

[14] O processo penal sugere a idéia da pena; e esta, a idéia do delito. [...] Mais concretamente, o processo penal se faz para castigar os delitos; inclusive para castigar os crimes. CARNELUTTI, Francesco. Como se faz um processo. 2. ed. Campinas: Minelli, 2004. p. 21.

[15] Pesquisa citada. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 06 jul. 2005.

[16] Entrevista concedida pelo Presidente do Colendo Superior Tribunal de Justiça ao Jornal da Tarde em 24 de abril de 2005. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 06 jul. 2005.

[17] A Defensoria Pública foi implantada no Estado de Mato Grosso em 1999, com a posse de 24 Defensores, quando se necessitava de pelo menos 90 defensores. Em 2003 a Defensoria contava com 40 defensores: 21 em Cuiabá, 08 em Várzea Grande, 02 em Barra do Garças, 02 em Tangará da Serra, 04 em Rondonópolis, 02 em Sinop, 01 em Juína e 02 em Cáceres. Atendem cerca de 50.000 pessoas diretamente e outras 200.000 indiretamente e estima-se que 80% da população mato-grossense é cliente dos serviços da Defensoria Pública no Estado. (Dados coletados na Defensoria Pública Cível de Cuiabá/MT, através do Defensor Público Estadual Cid de Campos Borges Filho, Secretário Geral da AMDEP, Membro da Comissão de Advocacia Pública da OAB/MT). Além disso, as funções da Defensoria Pública são a de promover extrajudicialmente a conciliação entre as partes em conflito de interesses; patrocinar ação penal privada; subsidiária da pública, patrocinar ação civil, patrocinar defesa em ação penal, patrocinar defesa em ação civil e reconvir, atuar como Curador Especial, nos casos previstos em lei, exercer a defesa da criança e do adolescente, entre outras.

[18] Cujas funções já haviam sido dispostas na Emenda nº 37/1987.

[19] SANTOS, Boaventura de Sousa. “A Sociologia dos tribunais e a democratização da justiça” in Pela Mão de Alice. São Paulo: Cortez, 1995. p. 170.

[20] Informações coletadas da Revista Consulex. Ano IV. N 44. Agosto, 2000.

[21] Informações coletadas da Revista Consulex. Ano IV. Nº 44. Agosto, 2000.

[22] MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça Gratuita. Rio de Janeiro: Forense, 1996.

[23] BARBOSA, Ruy Pereira. Assistência Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

[24] Idem, ibidem.

[25] Georges Gurvitch. Apud VELHO, Otávio Guilherme C. A; PALMEIRA, Moacir Soares G.; BERTELLI, Antônio Roberto. Estrutura de Classes e Estratificação Social. Rio de Janeiro: Editores, 1981. p. 95.

[26] BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. São Paulo: Ed. Difel, 1989, pp. 209-254.

[27] AGUIAR, Neuma. Hierarquias em Classes. Rio de Janeiro: Editores, 1974. p. 46.

[28] BARBOSA, Ruy Pereira. Assistência Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 152.

[29] SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice. São Paulo: Cortez, 1995. p. 168. Corrobora a questão o mestre Mauro Capeletti ao dispor que o obstáculo econômico – por este, grande é a porcentagem de pessoas que não tem acesso à justiça em razão de sua pobreza material; o obstáculo organizador – através deste, certos direitos ou interesses ‘coletivos’ ou ‘difusos’ não são tutelados eficazmente se não houver uma radical transformação de regras e instituições tradicionais de direito processual; o obstáculo propriamente processual – pelo qual certos tipos tradicionais de procedimentos são inadequados aos seus deveres de tutela. (BARBOSA, Ruy Pereira. Assistência Jurídica. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998).

[30] ADORNO, Sérgio. Crime, justiça penal e desigualdade jurídica. As mortes que se contam no tribunal do júri. In SOUTO, Cláudio & FALCÃO, Joaquim. Sociologia & Direito. São Paulo: Pioneira, 1999. p. 327.

[31] RADCLIFFE-BROWN, A.R. Estrutura e função na sociedade primitiva. Petrópolis: Vozes, 1973. p. 253.

[32] RADCLIFFE-BROWN, A.R. Op. cit. p. 259.

[33] PASTOR, Daniel R. Acerca del derecho fundamental al plazo razonable de duración del proceso penal. Publicada in Revista Brasileira de Ciências Criminais. Jan/fev. Ano 13. Nº 52. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 207.

[34] CARNELUTTI, Francesco. Como se faz um processo. 2. ed. Campinas: Minelli, 2004. p. 24.

[35] PASTOR, Daniel R. Op. cit. p. 207.

[36] Idem, ibidem.

[37] CARNELUTTI, Francesco. Como se faz um processo. 2. ed. Campinas: Minelli, 2004. p. 26.

[38] Opera-se de acordo com o crime, o número de imputados e de testemunhas, incidentes processuais, recursos etc.

[39] CARNELUTTI, Francesco. Op. cit. pp. 22-23.

[40] PASTOR, Daniel R. Op. cit. p. 209.

[41] Idem, ibidem.

[42] BECCARIA, Césare. Dos delitos e das penas. 2. ed. Trad. José Cretella Júnior e Agnes Cretella. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

[43] PASTOR, Daniel R. Op. cit. p. 210.

[44] KAFKA, Franz. O processo. Trad. Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2002.

[45] PASTOR, Daniel R. Op. cit. p. 215.

[46] PASTOR, Daniel R. Op. cit. p. 216.

[47] Idem, ibidem, p. 220.

[48] Id.,ibid. p. 228.

[49] LOPES JUNIOR, Aury Celso Lima. O fundamento da existência do processo penal: instrumentalidade garantista. Jus Navigandi. Teresina. Ano 03. Nº 27. Dez. 1998. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1060 >. Acesso em: 29 abr. 2005.

[50] Idem, ibidem.

[51] Esse direito é desmembrado na pretensão de consideração da situação do eventual afetado e a pretensão de proteção que impõe ao Estado o dever de agir, em casos extremos, contra terceiros – MENDES, Gilmar Ferreira. Os direitos individuais e suas limitações: breves reflexões. In MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Hermenêutica constitucional e direitos fundamentais. 1. ed. 2ª Tiragem. Brasília: Brasília Jurídica, 2002. p. 201.

[52] CARNELLUTI, Francesco. Arte do direito. Campinas: Edicamp, 2003. p. 73.

[53] SERRANO, Sérgio Abinagem. Processo penal garantista. Críticas ao sistema formalista. Jus Navigandi. Teresina. Ano 08. N. 305. 08 mai. 2004. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5191. Acesso em: 29 abr. 2005.

[54] RAMALHO TERCEIRO, Cecílio da Fonseca Vieira. A possibilidade do julgamento antecipado da lide penal. Jus Navigandi. Teresina. Ano 07. N. 65. Maio. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4015>. Acesso em: 22 fev. 2006.

[55] BATISTA, Weber Martins. Direito Penal e Direito Processual Penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 30. Apud SANCHOTENE, Salise Monteiro. Julgamento antecipado da ação penal – ilegitimidade de partes. Disponível em: <http://www.cjf.gov.br/revista/numero10/artigo2.htm>. Acesso em: 22 fev. 2006.


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