SUBJETIVIDADE E NOVAS TECNOLOGIAS DE COMUNICAÇÃO archivo del portal de recursos para estudiantes |
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Francisco Rüdiger
Professor-titular da Faculdade de Comunicação
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Desde Descartes, a subjetividade humana (sabemos com certeza se não há outras ?) vem sendo entendida como uma substância pensante, caracterizada pela constância, unidade e isolamento, a qual se oporiam o corpo e o mundo. A concepção do homem como parte de um todo mais amplo, responsável pela formação de sua identidade desde fora, em vigor há mais de três milênios, começou a ser abandonada. Desenvolveu-se a consciência de possuirmos um eu separado e distinto, formado desde dentro, a partir do confronto com os outros seres e pessoas. Falando noutros termos, perante a categoria relacional da pessoa emergiu pouco a pouco a visão do homem como sujeito portador de uma identidade individual [1].
Os recentíssimos progressos tecnológicos verificados com o aparecimento das máquinas geradoras de realidade virtual (simulação) e das redes de interação telemáticas estimularam o surgimento de uma reflexão teórica em que esses pressupostos passaram a ser profundamente questionados. Para seus porta-vozes, as tecnologias de comunicação vêm, realmente, promovendo uma multiplicação de contatos e conhecimentos cujo resultado principal, socialmente falando, é a paulatina mudança nas concepções vigentes sobre como se estrutura e funciona nossa subjetividade.
O desenvolvimento de mecanismos de interação e o surgimento de uma esfera pública virtual projetou-as em uma segunda fase, em que se vê caducar o conhecido esquema comunicador – mensagem - receptor[2]). Os participantes começam a transcender essa oposição, tornando-se usuários interagentes de redes abertas e sem centro, nas quais "os sujeitos se tornam cada vez mais instáveis, múltiplos e difusos" [3]. As fantasias tecnológicas pretendem que "o mundo será formado por indivíduos capazes de se multiplicar através de aparelhos portáteis e interconectados em espaços relacionais por redes estelares de satélites e redes terrestres de fibra ótica"[4].
As cogitações sobre os possíveis modos de ser do homem feitas pelos filósofos, poetas e artistas do passado estão perdendo o caráter fantasioso. Através da máquina, começamos a viver situações em que não apenas o referido eu tornou-se múltiplo, fluido e aberto mas, além disso, está surgindo uma nova forma de identidade. A sociedade cibernetizada permite a refração da personalidade em múltiplos eus e radicaliza as possibilidades de emprego da ficção no comércio cotidiano. As pessoas estariam pois passando a ter chances de, virtualmente, trocarem de sexo, modificarem a idade e assumirem novos papéis e identidades.
"No tempo real do ciberespaço, oferecem-se ao indivíduo mais possibilidades: a identidade torna-se fragmentada quando convertemos o que somos de múltiplas maneiras. Como construímos e reconstruímos o eu depende muito do crescente número de pessoas que encontramos e de como elas nos respondem. Se alguém pretende participar satisfatoriamente do corpo de uma comunidade virtual, possuir vários eus não é apenas possível mas necessário: algo inevitavelmente ditado pela tecnologia." [5]
A televisão pôs um pântano em movimento ao colocar a nossa consciência um número cada vez mais amplo e variado de estilos de vida, maneirismos, sentimentos, papéis e pensamentos. Rapidamente, o veículo multiplicou nossas possibilidades de sermos outros, de sermos diferentes do que nos tornamos, mostrando-nos imagens mais ou menos realistas das mais variadas formas de experiência humana. Deslocando seu centro em múltiplas direções, a televisão procedeu, noutros termos, a uma desterritorialização generalizada da subjetividade do conjunto da população.
Os princípios de simulação e interação que se impuseram às tecnologias do espírito no último decênio radicalizaram essa situação, possibilitando-nos não apenas ver mas, avançando, participar, ainda que virtualmente, da criação e recriação da totalidade da experiência humana. A sociabilidade virtual engendrada pela televisão convencional permitia-nos assistir aos acontecimentos. As máquinas criadoras de realidade virtual, sejam câmaras de simulação, videogames ou salas de conversação ciberespaciais, levam-nos mais longe, possibilitando que nos tornemos seus protagonistas.
'"A experiência tecnológica do cyberspace convalida para si um sentido próprio de virtual na medida em que cada usuário teleinteragente intervém, desliza, trafega na virtualidade do outro, quer dizer, á sombra de sua miragem objetiva, de seu espectro que circula na estrutura virtual 'cavada' no vácuo eletromagnético das elásticas infovias"[6]
Marc Guillaume estudou com pioneirismo esse fenômeno, ressalvando acertadamente porém que os maquinismos logotécnicos e interativos não têm vida própria: representam fatores que radicalizam uma tendência social mais profunda. No entanto, o pensador não deixa de concordar com a hipótese de que esses mecanismos de comunicação e ficcionalização do social "promovem uma espécie de elisão do sujeito, o seu desvanecimento parcial em um jogo indefinido de identidades flutuantes". Em última instância, verifica-se que, por sua causa, "a posição de sujeito individual, essa invenção recente, parece destinada a ter um fim muito próximo" [7].
As concepções acerca do eu criadas por românticos e liberais estão caindo em desuso, caducando, assim como as relações sociais que elas apoiavam, na medida em que as tecnologias emergentes saturam-nos com uma variedade de estilos de vida e imagens que tende a nos privar de centro, seja ele o do eu racional, seja ele o do eu autêntico. Os propósitos sociais que eram atendidos pela crença em tais conceitos estão se tornando difíceis de estabelecer num contexto em que
"A credibilidade no mundo interior é colocada sob suspeita, a existência de um centro subjetivo no ser é problemática, e as instituições que se justificavam por essas premissas são sujeitas a uma análise crítica." [8]
Em síntese, o resultado combinado desse processo seria, portanto, nosso ingresso em um mundo no qual nós já não vivemos um sentimento seguro de possuir um eu e no qual há cada vez mais dúvida sobre a suposta existência de uma identidade individual bem delimitada. Primeiro a Internet promove uma colonização da linguagem cotidiana, que condiciona o processo de formação da consciência de um número sempre crescente de indivíduos. Através desse e outros processos todavia acaba estimulando ou favorecendo uma pluralização do eu em escala e força que, no limite, arrisca ou condena ao desaparecimento pelo menos este tipo de identidade.
"[No limite] O Internauta que se percebe como máquina viva e pensante todavia chega a suspeitar que é prisioneiro em um corpo cujas possibilidades são terrivelmente limitadas, passando a sonhar em se fundir com a máquina, de nela se dissolver a fim de não mais se submeter à necessidade trivial de comer, beber, dormir e de cuidar de um corpo que o lembra a todo o momento de seus limites individuais: sua hibridação com a máquina, se fosse um dia possível, resolveria seu problema." [9]
O presente relato se propõe a colocar em questão as teses que preparam e de certo modo nutrem esse último extremismo histórico e ontológico, cujas origens, defendemos no estudo anterior, podem ser buscadas no pensamento nietzscheano. O desenvolvimento das máquinas criadoras de realidade artificial e interação à distância tem ensejado um ressurgimento do determinismo tecnológico como paradigma de explicação da cultura e comunicação que, será nossa sugestão, não passa sem polêmica.
Baseando-nos em dados de alguns relatos de pesquisa recentes trata-se pois, no que segue, de (1) levantar, ainda que brevemente, alguns tópicos relativizadores dessa abordagem; e de (2) assinalar alguns problemas presentes nas teorias que, surgindo em reação aos excessos do discurso pós-modernista sobre as comunicações, não obstante reconhecem a necessidade e validade de enfrentar as questões que esse coloca a respeito do destino da subjetividade na era das novas tecnologias de comunicação.
A perspectiva metodológica em que se situa o trabalho culmina até certo ponto a linha de estudo conduzida até agora ao longo do volume, se admitido que uma abordagem ao mesmo tempo crítica, histórica e interpretativa de ampla abrangência dos temas tratados mereça ser chamada de antropologia da cibercultura. A expressão não é a de nossa preferência, mas vem a ser útil no momento em que por seu intermédio podemos pelo menos apontar para uma reflexão de ordem metodológica sobre a natureza da investigação nestas páginas conduzida[10].
Partindo da reconstrução de alguns pressupostos históricos mais amplos e da reflexão crítica sobre sua mediação filosófica, pretendeu-se nos textos anteriores examinar criticamente algumas das postulações feitas em relação à cibercultura pelos intérpretes interessados em pensar as questões do sujeito e do objeto no âmbito das novas tecnologias de comunicação. Agora trata-se de retomar o ponto inicial meditando com a mesma atitude sobre os materiais colhidos por algumas pesquisas de etnografia on-line, seguindo-se a sugestão de que, baseando-se em elementos empíricos e históricos, é possível "separar o que pode ser dito de maneira razoável ... do enorme nonsense que existe em relação a esse assunto" (idem, p. 225).
A cibercultura compreensivelmente vem ensejando a disseminação de uma formidável retórica celebratória, de natureza propagandística, que uma vez notada todavia deve ser levada a sério, por ser sintoma de um processo mais amplo e profundo que, esse sim, está a exigir uma análise crítica rigorosa e intransigente acerca de seu significado. Nesse esforço, o elemento diferencial não são as fontes dos materiais sob análise, nem os métodos empregados para sua coleta. O principal é a capacidade de resistir às exigências de renuncia à reflexão em favor das imagens com que agora se apoia e move nossa época e pensar de maneira crítica e independente os problemas que ela coloca aos contemporâneos e à humanidade histórica.
Kenneth Gergen pode nos servir de primeiro interlocutor nessa tarefa, na medida em que sua obra sobre o eu pós-moderno tornou-se, com o passar do tempo, uma referência seminal da discussão sobre a sorte do sujeito na era da cultura tecnológica. Em The saturated self, o pensador de fato desenvolve a hipótese de que as tecnologias de comunicação puseram em movimento um processo cujo resultado é a virtual erosão da noção de eu (self) e a resultante disseminação da consciência de que a identidade individual é criada e recriada através de nossos relacionamentos. O sujeito tende neste contexto a ser redefinido em termos relacionais, de modo que, no futuro, "as relações (sociais) passarão a ocupar a posição central que teve o eu individual durante os últimos séculos da história ocidental" [11].
O primeiro passo ocorreu, segundo o autor, quando o indivíduo descolou seu eu dos papéis sociais, passando a manipulá-los de acordo com seus interesses egoístas: trata-se de um estágio dominado pelo que ele chamou de manipulação estratégia. O segundo surgiu com a perda de limites havida por essa prática e sua extensão para todas as esferas da vida, processo esse através do qual o indivíduo se transforma mais e mais em pastiche. No final, acontece que sociabilidade surgida com a multiplicação de contextos vitais dessa espécie dá lugar a um eu relacional: então, o indivíduo desenvolve a consciência de que seu eu é uma ilusão e ele mesmo não é mais do que a soma de suas relações com os outros.
"Os estágios iniciais dessa consciência culminam com o sentimento do eu ser um artista social que manipula imagens para atingir seus objetivos. Na medida em que, assim, a categoria do eu real continua a fugir de vistas, ocorre porém a aquisição de uma personalidade semelhante a um pastiche. Contradição e coerência deixam de importar, já que se tira prazer da expansão das possibilidades de ser em um mundo socialmente saturado. Finalmente erodidas as distinções entre o real e o forjado, o estilo e a substância, o conceito de eu individual deixa de ser inteligível, chegando o ponto em que se está preparado para a nova realidade dos relacionamentos."
Aparentemente, Gergen pretende firmar nessa passagem três pontos :
1. "Passamos a perceber que quem e o que somos não é tanto o efeito de nossa essência individual (sentimentos reais, crenças profundas e coisas do tipo) mas da maneira como somos construídos nos diversos grupo sociais";
2. "[Doravante] não podemos mais determinar com segurança o que é ser um tipo específico de indivíduo (person) - homem ou mulher - ou mesmo o que é ser o próprio indivíduo (person) "
3. "[Na pós-modernidade,] começa a se apagar a noção de eu (the category of self)" (idem, p. 171).
Conforme resume Michel Maffesoli, ainda que sem sugerir um determinismo tecnológico, nessa era ocorre que "o indivíduo [enfim] importa menos do que a pessoa"[12].
A revisão da literatura em que essas teses pretendem encontrar suporte empírico e a reflexão crítica sobre suas premissas teóricas fornecem-nos, segundo nosso modo de ver, elementos para não somente problematizar essa idéia de que a pluralização dos contextos de vida em curso hoje em dia resulta na supressão da noção convencional de eu como ir além. Permite-nos pensar se o que ocorre não é, antes, o oposto: o reforço da consciência do indivíduo constituir esse eu, o fortalecimento social da sensação de que esse eu corresponde ao sujeito da consciência concebido pela filosofia idealista.
Teoricamente, podemos conceber com boas razões a hipótese de que a manipulação estratégica e a identidade pastiche que, no limite, resultam da cultura moderna não são seguidos pelo aparecimento da consciência relacional. A liquefação do indivíduo na realidade virtual é ideologia, aparência socialmente necessária. Em última instância, o sujeito proteico que nela se expressa ainda é um sujeito que pensa em si mesmo como um eu livre, distinto e separado da estrutura societária.
As ciências sociais se baseiam no pressuposto de que o homem é um ser social. O reconhecimento científico-social de que a figura do indivíduo é um produto histórico, resultante de processos de interação e poder, contudo não tem o poder de quebrar o conceito metafísico do sujeito, porque esse é uma abstração real, produzida por fatores sociais de peso muito maior do que o do conhecimento sociológico.
O supracitado conceito, encarnado por nós no sentimento de
possuirmos um eu focal, distinto e separado, possui raízes sociais e, por isso, não pode ser liquidado por decreto epistemológico. Raciocínios teóricos não têm o poder de suprimir ficções sociais, na medida em que são necessárias como condições da práxis dominante. Provocam abalo e começam a modelar um novo imaginário mas seu destino não deve ser deduzido mecanicamente. Somente a história poderá mostrar se, uma vez abolidos os fatores que o engendraram, ele virá a desaparecer do proscênio societário.
Robert Jay Lifton é, nesse aspecto, um dos poucos teóricos atuais a defender que o sujeito proteico por ele pensado ainda nos anos 60 não conduz a supressão do eu, no sentido de uma fragmentação que, no limite, conduz a perda de coerência entre suas partes. Para ele, a figura "supõe a procura de autenticidade e signifiado [individual], uma interrogação sobre a forma de existência do eu próprio" [13].
Seguindo essa hipótese, sustentaremos que apesar de todos os esforços no sentido oposto que surgem em conexão com seu progresso, a tecnificação da cultura não suprime, antes reforça, o sentimento reificado do eu como algo que pode ser localizado dentro dos indivíduos. A sociabilidade tecnológica não é, pelo menos ainda, um estimulador para as pessoas se entenderem, ainda que em parte o sejam, como seres relacionais, conforme percebeu pioneiramente Georg Simmel.
Conforme observado pelo pensador ainda no começo do século passado, o indivíduo resiste a ser nivelado pela técnica da vida moderna, procurando manter sua subjetividade no caminho que sua consciência aprendeu a trilhar neste mesmo contexto. Argutamente, ele percebeu que a tecnificação cada vez mais radical das várias esferas da vida leva à dispersão do sujeito tanto quanto à tomada de consciência dessa condição (de ser sujeito) por parte do indivíduo, embora não tenha relacionado o processo com a crise de identidade que tem lugar na cultura moderna. Os fenômenos têm a mesma fonte e compõe lados opostos de um único e mesmo processo.
Simmel não caiu no jogo fácil de aceitar o perspectivismo com o qual se pode pensar em ligar a experiência contemporânea das redes com a filosofia de Nietzsche. A fragmentação da cultura moderna é ambivalente na medida em que é um fator favorável à dissolução do eu tanto quanto a sua síntese transcendental por um contigente cada vez maior da população.
Em Filosofia do Dinheiro (1900), o pensador observara que a fragmentação das atividades sociais e o emprego de meios técnicos em cada uma delas, promovidos pela economia de mercado, conduzem à desintegração da personalidade nos papéis exigidos por cada situação, dispensando as faculdades e fatores que, desnecessárias no caso, não obstante reunidas configuram o conceito de personalidade[14].
Entretanto, continua, precisamos observar igualmente que essa desintegração da subjetividade também resulta em um redirecionamento do indivíduo para seus próprios recursos e habilidades, tendo em vista a necessidade dele se deslocar entre esses âmbitos, e isso tende a torná-lo mais consciente de si mesmo do que o seria numa situação marcada por um menor grau de relacionamento[15].
Karl Marx havia notado nos Manuscritos de Paris que "o homem é o eu", a consciência de si como sujeito, mas esse não é dado, "é o homem concebido em abstrato e produzido pela abstração", dentro de condições históricas determinadas, particularmente as associadas com o desenvolvimento do capitalismo[16].
Simmel retomou essa idéia, ainda que sem a conhecê-la, explicando que essa consciência é favorecida pela economia mercantil, porque, como ele diz, a desvinculação de toda relação orgânica com a realidade exterior e o sentimento de que opomo-nos a essa realidade como um eu último e irredutível coincide com o conceito idealista de sujeito[17]
A explicação mais detalhada para tanto encontra-se porém em uma passagem de sua Sociologia (1908).
O pensador observa aí que, conforme o homem passa a circular e conviver em mais de um coletivo social se abre um maior espaço para desenvolver sua individualidade. A pertença a um coletivo bem definido tende a limitar a liberdade pessoal e, assim, as peculiaridades do indivíduo. As manifestações individuais transcorrem de acordo com os padrões ditados de fora e engajam o conjunto de personalidade. A pessoa deseja se destacar entregando o todo de seu eu a uma causa que não tem origem nesse eu mas nas decisões de sua coletividade.
A civilização moderna, contrariamente, estimula o florescimento do individualismo, da consciência de ser um eu, porque à criação de várias esferas de vida corresponde uma maior liberdade do indivíduo. A fragmentação da sociedade em vários círculos exige cada vez menos de sua personalidade total, resulta em menor cuidado externo, permitindo-lhe perceber mais a si mesmo. A multiplicação dos círculos sociais faz com que se afrouxem os vínculos sociais com cada grupo e se evidencie o caráter separado e único de cada indivíduo.
"Em diversos sentidos, a natureza humana e as circunstâncias estão dispostas de tal maneira que, quando as relações do indivíduo ultrapassam determinada extensão, ele passa a se ater mais a si mesmo. Não se trata apenas de uma extensão puramente quantitativa do círculo, que, por si só, tem de reduzir a um mínimo o interesse pessoal por cada um de seus membros, mas também da variedade qualidade que impede que o interesse se fixe parcialmente em um ponto determinado, e faz com que o egoísmo surja como resultado lógico da correlata paralisação de tantas pretensões incompatíveis." Simmel, op. cit., p. 793.
O sentimento de constituir um eu individual, uma personalidade separada e única, aumenta de acordo com a velocidade, intensidade e variedade das mudanças com que o homem se defronta. A permanência precisa da mudança para ser concebida. Destarte, quanto mais diversas e mais fortes forem essas experiências, mais forte o homem se sentirá como um ego, mais o eu aparecerá como centro imóvel ou fundamento da identidade individual.
”Devido ao seu caráter de massa, à variedade incessante, à igualação das incontáveis qualidades conservadas até agora, ninguém negará que o estilo de vida moderno produziu enormes nivelamentos na forma pessoal de vida. Entretanto, precisamos reconhecer também as correntes contrárias que, apesar disso, podem se ver contidas e desviadas do ponto de vista de seu efeito total aparente. [O fato é que] a vida em círculo amplo e a relação com ele desenvolvem em maior grau a consciência da personalidade do que a vida em um círculo estreito."[18]
A consciência de si como sujeito transcendental, como sendo um eu, como algo que está além das peculiaridades individuais nasce com a percepção da diferença entre essas peculiaridades e a subjetividade em que elas se alojam, com a percepção de que essas peculiaridades não têm ligação direta com o eu, podendo ser por ele manipuladas até certo ponto livremente.
Nas sociedades pré-modernas, a subjetividade está, por assim dizer, fundida com os sentimentos, experiências e impressões externas. A existência é geralmente vivida como espera ou motivo de contemplação. O fracionamento da alma e o sentimento de vazio interior são praticamente nulos, porque ela é preenchida com os conteúdos da cultura como uma unidade. A consciência de si não se separa dos papéis que lhe confere a coletividade, e as expressões individuais se restringem à maximização das possibilidades contidas nesses papéis.
A desintegração das estruturas holísticas significa, ao contrário, a possibilidade de o eu aparecer à consciência como ponto fixo e abstrato, em relação ao qual se sucedem os acontecimentos; constitui uma condição histórica para o desenvolvimento da consciência transcendental porque
"Os estímulos sentimentais, que têm particular importância para produzir a consciência subjetiva do eu [o sujeito da consciência] se dão ali onde o indivíduo muito diferenciado convive com outros indivíduos muito diferenciados também, produzindo-se então comparações, roçares, relações especializadas, uma multidão de reações que, em círculos estreitos e indiferenciados, permanecem latentes, enquanto aqui provocam o sentimento do eu como o absolutamente próprio justamente por sua abundância e divergência."[19]
Conforme vimos acima, a tragédia da cultura provém da crescente dificuldade que esse indivíduo encontra de desenvolver o caráter único de seu eu que se evidencia com o processo histórico que dá origem a essa consciência tanto quanto à supracitada dificuldade[20]. Atualmente, a possibilidade de desenvolver harmoniosamente o conjunto da personalidade peculiar e distinta, satisfazer o ideal de uma cultura individualista, sucumbe ao subjetivismo, o princípio de expressão do eu baseado (ideologicamente) na arbitrariedade: nenhum costume ou modo de ser possui valor absoluto e, por isso, o fundamento para adoção de um ou outro se torna cada vez mais subjetivo.
"O subjetivismo individual da vida moderna, sua arbitrariedade desregrada, não é outra coisa que a expressão do fato de que esta cultura das coisas, das instituições, de pensamentos objetivos, indescritivelmente extensa, complicada e refinada arrebata ao indivíduo particular a relação interna unitária com o todo da cultura e remete esse todo de volta a si mesmo." [21]
Malgrado tudo, Simmel viu pois a modernidade como uma totalidade cujas várias facetas só se mantém juntas - subjetivamente - no plano do interesse egoísta e da consciência transcendental. A crescente divisão da realidade histórica e natural em diversas esferas autônomas é correlata ao florescimento do sentimento de liberdade e à redução do eu à faculdade abstrata de desejar (vontade). O pensador não descarta a hipótese de o eu entrar em colapso mas, em sua visão, o fenômeno dominante é antes o realçamento da consciência transcendental: é isso que está na raiz da experiência cultural do homem contemporâneo.
Conforme os próprios escritos simmelianos deixam ver, o processo de descentramento do sujeito que vem tendo lugar em nossa cultura há cerca de um século produziu um abalo em seu movimento de posição na práxis cotidiana, tanto quanto em sua reflexão teórica. A categoria do sujeito perdeu muito de sua autonomia relativa, em virtude da dispersão por que passa na sociedade contemporânea. A fragmentação das identidades sociais promovida pelo racionalismo técnico-mercantil todavia não leva à perda do sentido em ser um eu, porque esse processo não é mecânico, sendo antes mediado por essa forma de consciência.
"A Internet contribuiu para nos fazer pensar a identidade em termos de multiplicidade", mas isso não significa que as experiências virtuais estão subvertendo a noção de eu essencial porque, como diz a própria autora do enunciado, na rede, "as pessoas são capazes de construir um eu ao flertar com muitos eus"[22]. O conceito de eu singular e interior é posto em questão mas isso não quer dizer que se dissolva. Conservado algum referência às circustâncias históricas e sociológicas que permitem entender o fato, não passa por alto o ponto quem nota que as tecnologias de comunicação possuem um sentido individualista muito mais do que comunitário.
Guilaume fala da ascensão do conduta comutativa, no sentido de que se torna cada vez mais fácil se desvincular dos laços sociais sem interesse para o indivíduo. O cibernauta corporifica o homem do ressentimento na medida em que pode viver apenas de acordo com suas inclinações, desligar-se sem riscos e, no limite, permanecer isolado durante o tempo que for conveniente[23]. A tendência do século vindouro, por isso, parece que é uma socialização cada vez mais tecida de inideferença, distãncia, insularidade e egoismo, pontuados por relacionamentos superficiais, breves e , ainda que eventualmente intenos, "ao invés de se habiar uma comunidade, mas coabitar anônimo e anômico os labriritnos das redes" (idem, p. 28-29).
Na verdade, caberia pensar além e perguntar se o crescente parcelamento da alma promovido pelas novas tecnologias virtualmente não conduz os indivíduos a uma maior conscientização desse eu; se a manipulação de papéis por elas estimulada, ao invés da criar um novo conceito de pessoa, não aprofunda o processo de abstração social do sujeito que está na base do niilismo contemporâneo; se, enfim, o ciberespaço, ao invés de um espaço de construção do sujeito relacional, não é, enquanto nova frente de lazer industrial, um elemento de potencialização da sociedade de comediantes da qual falava com tanta ambigüidade Nietzsche n´A Gaia ciência (1882).
A possibilidade das redes virtuais ensejarem projeções radicais, em que a personalidade experimenta uma dissociação, passando, dentro e fora dela, a se confundir com diversos personagens, que temem muitos estudiosos, sem dúvida é uma possibilidade que não pode ser descartada. O conhecimento de certos casos levou um analista a concluir que "o ciberespaço pode levar a experiência individual a tal grau de concentração que pessoas que em outras situações seriam racionais podem ser levadas ao abismo - sem perceber que cruzaram a linha, ... [porque] ... certas facetas dele tornam fácil o perder contato com a realidade"[24].
Aparentemente, a regra todavia não é essa. O depoimento de um informante de uma pesquisa, ex-usuário de drogas, corrobora a hipótese de que, ao contrário de situações aparentadas, no espaço virtual, a consciência só é alterada sob controle:
"Eu fiz experiências com drogas químicas alteradoras de consciência que possuem forte intensidade mas a falta de controle sobre seus efeitos é perturbadora. As experiências interativas e com jogos permitem criar o mesmo efeito até certo ponto, [com a vantagem de] serem muito mais acessíveis e muito menos exigentes e ameaçadoras." [25]
Relativamente ao ponto, conviria em primeiro lugar evitar a tentação de atribuir fatos como esses à tecnologia. Lembremos que Fernando Pessoa não precisava de um computador para viver intensamente vários personagens, sem ser tomado como um doente dos nervos. Para não nos estendermos, observemos adicionalmente que os fenômenos de possessão, relacionada com a vontade de crer assinalada pelo pragmatismo do início do século, existiram muito tempo antes de surgirem as máquinas de simulação interativas.
Em segundo, precisamos notar que o problema que vimos discutindo não se deixa entender nesse registro. A psicologia clínica tradicional costuma tratar a divisão do sujeito em múltiplos pessoas como uma patologia (multifrenia). Porém, não é esse, em tese, o caso que estamos lidando, quando o assunto é nossa aventura recém-iniciada com o espaço virtual. As pessoas, por suposto, se dividem em várias personagens, invertem relações de gênero, ficcionalizam o real, mas, em geral, não perdem o controle da situação. Os simpatizantes dos chamados movimento tecno-pagãos, que incluem desde os freqüentadores de festas jovens até profissionais entendiados com a frieza da vida moderna, pretendem empregar os recursos computacionais para permitir a saída da prisão que, para eles, são seus egos, mas essa corrida em direção à tecnologia como magia arcaica nada tem de arcaico no sentido autêntico da expressão.
A pluralização do sujeito promovida pelas novas tecnologias é uma fenômeno de possessão racionalizada. Os relatos de pesquisa à disposição sugerem que, no limite, pode haver regressão do ou mesmo dissociação da personalidade. Porém, a regra não é essa, como vamos sugerir em seguida. A comparação com as experiências seculares com drogas seria, à primeira vista, mais promissora em termos de esclarecimento da problemática.
Henry Jenkins (MIT), por exemplo, afirmou que a realidade virtual será a passagem para se fazer as "viagens" do futuro: será "um espaço alucinógeno que poderemos percorrer sem ressaca, que o corpo sentirá de maneira muito intensa, mas sem os riscos físicos das drogas, será uma droga sem produto químico"[26]. A postulação do autor da frase indica por si só os limites da comparação pretendida, mas também revela sem querer o fundo comum ou um elemento de ligação entre o consumo de lazer, o progresso técnico e a inclinação à toxicomania da contemporaneidade.
De qualquer modo, permite reiterar que a volatização dos papéis decorrente da crescente desorganização das instituições não-econômicas promovida pelo capitalismo e o aparecimento de novas tecnologias não excluem a hipótese da dissolução desse eu, a perda da consciência de si como sujeito com a qual sonhava Nietzsche. Conforme observado acima, a possibilidade deveria ser vista como uma patologia da era virtual, porque o território desse processo tende a se limitar ao lazer. O sentido profundo do fenômeno em foco, visto mais de perto, deveria ser entendido, por um lado, como divertimento relaxante e, por outro, como promovedor da condição de manipulador estratégico dos papéis que o indivíduo tem de fazer no sistema social vigente, qualquer que seja a sua dimensão.
Hoje em dia, predomina como tendência social a manipulação subjetivista dos papéis culturais, e a expressão jogo empregada para defini-la no plano das redes é, em geral, um eufemismo para caracterizar uma cultura em que a manipulação e, portanto, os problemas (morais) da identidade tendem a virar fatores constitutivos. Concluindo trabalho de pesquisa sobre as relações virtuais, os pesquisadores mais críticos da cibercultura têm podido observa que "o espaço virtual tende a reproduzir o espaço cartesiano, no qual vemos o mundo a partir de um ponto de vista único, fixo e determinado", de modo que "ao invés de criar agenciamento e autonomia, ela tende antes a criar posições subjetivas que se estruturam com base em fantasias de controle, onipotência e dominação" [27].
Acompanhando os estudos de Christopher Lasch e outros na linha da Escola de Frankfurt, preferimos pensar portanto que a tendência estimulada pelas novas tecnologias de comunicação, ao invés do livre jogo da imaginação, é antes a exposição do eu como mercadoria. A relativização do eu promovida por elas é parte de um discurso utópico, que precisa ser visto com atitude crítica. A Internet oferece novas possibilidades de desenvolvimento individiaul mas antes de também implicar em riscos e perigos está submetida a um racionalidade mercantil e às fantasias de poder com que essa se associa.
"Na Internet, você é o único limite", proclama um anúncio comercial, citado por Jean-Marc Mandosio[28]. As tecnologias de comunicação estimulam o processo de erosão das identidades com que os modernos tentam manter seu equilíbrio anterior ou proteger sua subjetividade, ao permitirem a realização de uma variedade de performances numa infinidade de contextos. "As tecnologias virtuais encorajam a crença de que somos 'máquinas transcendentais' dentro das quais o sujeito imaginante pode deixar escapar sua âncora física privatizada e viver no âmbito de uma icnonografia de prazeres" (Hillis 172) A circulação sem destino aparente se confronta com uma certa rigidez mecãnica estimulada pela própria natureza ativa e flexível do ve´ciulo. O automatismo com que os usuários se movimentam pelas redes se confornta uma inércia intelectual determinada quase tradicionalmente. "A existência nos pressiona de maneira inapelável; não permite que se obtenha uma identidade polivante sempre crescente sem custos" (Hillis 189).
A tendência à sublimação da realidade no espaço virtual criado pela rede colide com a prova de realidade que a vida nos impõe. As experiências virtuais com a identidade não devem ser vistas como criadoras de uma nova forma de sociedade. A progressiva mediação da ação social por parte delas não é mecânica, não é direta, nem muito menos importa em uma superação radical dos padrões existentes. A expansão do ciberespaço representa antes de mais nada um fenômeno inscrito nas tendências históricas e circunstâncias sistêmicas que governam a contemporaneidade.
David Hakken relata não por acaso várias pesquisas, suas e de outros, que mostram ser nossas relações com as máquinas cópias das relações sociais mais cotidianas. A construção dos programas na indústria da informática, não menos do que as conversas feitas nos chats, não surge livremetente, embora não se possa ignorar sua eventual inventividade, segundo certas tendências de conduta social e determinadas histociamente [29]. Nesse sentido, a referida expansão constitui processo que, segundo cremos, medeia e se apoia sobretudo em nossa inclinação, socialmente criada, de vivermos nossas fantasias de modo puramente interno, mental ou subjetivo, ainda que cada vez mais mediado mercantilmente.
Pesquisadores diligentes como Sherry Turkle observaram que, através das tecnologias computacionais, "as pessoas se tornam mestres da auto-apresentação e auto-criação"[30]. A proposição todavia peca pela abstração, na medida em que carece de determinação histórica. Desde o início, as comunicações modernas nos encorajaram a ver a criação do eu como a mais alta forma de arte da vida social. O filisteísmo embutido nessa idéia não pode ser separado porém do fato de que, na economia de mercado, as pessoas têm de projetar uma imagem atraente e tornar-se atores conscientizados de que vivem sob o constante escrutínio de seus amigos, tanto quanto de vários tipos de estranhos; dos colegas tanto quanto de seus superiores nas esferas pública e privada [31]
Embora o relato seja de cunho eminentemente jornalístico e testemunhal, não faltam legítimo sentido crítico e boa percepção sociológica ao exame das práticas e modo de vida dos agrupamentos tecnolibertários da costa oeste norte-americana feito por Paulina Borsok. Tendo convivido por vários anos com esse grupo e partilhado do que chama de suas ilusões por muito tempo como profissional de informática, a escritora e signatária do manifesto tecno-realista se vale da tradição dos muckrackers para desmacarar o caráter prepotente, cínico, oportunista e anti-social de boa parte de sua subcultura. Pretensos herdeiros dos movimentos de contestação dos anos 60, os tecnolibertários revelam-se à luz do exame da autora a encarnação da quinta-essência do sujeito narcisista teorizado por Lasch e retratado com cores sombrias em sua variante bursátil por O Psicopata Americano, de Brad Ellis.
"Desde o momento em que o dinheiro high tech começou a correr, surgiu uma atitude contraditória e pós-moderna em relação a ele [por parte do pessoal da informática]. Certamente o dinheiro é uma forma de se manter em alta. Embora haja muito correndo por aí, não se pode esquecer porém que há os que não o tem. ... Assim muitos não se decidem o que fazer com a grana que tem ganhado - exceto se comprazer em criar novos negócios, construir alguma coisa e depois sumir do mapa ... porque se você fracassa uma vez [como empregado], existe nesse meio o medo de que você jamais venha a ter sorte novamente com outra companhia"[32].
Apenas podemos remeter o leitor a esse texto amplamente documentado, que gerou impacto e mal-estar nas pretensões de boa consciência de vários ciberpensadores e pessoal ligado à área de informática nos Estados Unidos. O caráter de relato de apostasia que o texto porta não deveria é certo nos levar a tomá-lo como juízo conceitual sobre o sentido social e histórico da tecnocultura, porque esse em vários planos o ultrapassa, mas também não deveria ser escanteado, porque indica ainda que de forma não-reflexiva, como a posição do fenômeno se baseia na dinâmica e dos impulsos que não se originam na tecnociência mas antes na prática de um capitalismo radicalizado.
"Cada cultura tem seu mito de criação: a indústria de computadores pessoais possui como uma de suas narrativas principais a história de que o povo surgiu da contracultura e ansiava por liberdade até que essa máquinas o livrou da opressão dos esquemas padronizados, das mãos pesadas dos departamentos de organização e métodos das corporações e da servidão à Companha de Computadores do Papai. [Entretanto] os computadores pessoas não são apenas uma forma de dar poder às pessoas. Jamais esqueçamos que hoje em dia os computadores portáteis se tornaram um meio de mante-las, aonde quer que elas estejam e mais do que nunca, presas à coleira de seus clientes e de suas companhias."[33] (p. 234-235)
Destarte conviria ver como fundamentada na realidade social o entendimento que o ciberespaço não é bem outro mundo como pretendem seus propagandistas mas um campo social que, a despeito das especificidades, sobretudo de suas projeções míticas e utópicas, carrega consigo problemas e mazelas semelhantes às que encontramos no cotidiano mais ordinário, contém forças de repressão tanto quanto de liberação humanas.
"No plano do indivíduo, parece existir uma força libertária que faz recuar o estado e a burocracia em favor de comunidades virtuais livremente criadas e mantidas. No social, o poderio tecnológico (technopower) parece constituir os indivíduos de modo que os sujeita ao poder das elites online que estão emergindo. No imaginário, porém, encontramos essas duas possibilidades de forma hiperbólica, o que parece sinal da dramática urgência com que se solicita ao ciberespaço que, enfim, nos libere da maneira mais profunda possível ou nos reprima (totalmente)" [34].
Todavia precisamos avançar mais do que sugere a perspectiva do autor, demasiado presa a um esquema formal, ainda que bastante esclarecido em alcance analítico e sistemático. A abordagem crítica do ponto exige sua avaliação histórica concreta e, para tanto, não há como se furtar à tentativa de interpretação. Partindo dessa ótica, verificar-se-ia que a tendência predominante na formação da cibercultura, pelo menos a médio prazo, é a subordinação do imaginação criadora aos imperativos sistêmicos da indústria cultural capitalista.
Conforme conclui Stallabras em seu exame das telecidades, "as manifestações atuais da cultura computacional não são pós-modernas mas ao mesmo tempo uma intensificação e uma transformação do modernismo, que não servem às necessidades das pessoas, mas antes áquelas dos poderes superiores, em particular o poderio universal do mercado. Isso tem pouco a ver com a técnica como tal e com a qual se poderia projetar alguns prospectos de uma mudança radical [na vida social], sendo antes determinada pela atual hierarquia vigente na sociedade" [35].
A capacidade imaginativa do sujeito é ao mesmo tempo estimulada e neutralizada pelas novas tecnologias, na medida em que se ela por um lado permite explorar , senão criar novos mundos, por outro é cada vez mais sujeita a engenhos que limitam esse potencial e conduzem mecanicamento e de maneira esterilizante o indivíduo. As máquinas longe estão de pensarem. Os controladores da coisa é que o fazem e o fazem de modo a que não pensemos, uma vez que sabem, através de todo o tipo de calculo e informação, como nos conduzimos normalmente.
"A dissolução acelerada da razão nas águas tépidas da falação inconsequente
(bavardage) é acompanhada da convicção, cada vez mais difundida, de que a razão não é nada mais do que a simples capacidade de cálculo" (Mandosio, 178)
Aparentemente, o maquinário interativo permite às pessoas serem o que quiserem, trocar de sexo, inverter o caráter, viver a própria morte, etc. Também não é incomum as pessoas se dividirem em várias personagens, conforme o contexto, quando não o fazem em um mesmo domínio de interação. As pesquisas revelam porém que isso não se faz à revelia do si mesmo: na maioria das vezes, não envolve nenhuma perdição, como muitos desejam[36]. A experiência carnavalesca que se pretende liberada via redes não tem sido constatada de maneira ampla e disseminada por muitos que se propõe a testar enpiricamente a hipótese. O número de pessoas que se entrega aos jogos com mascaradas é muito pequeno em comparação com os que, embora as vezes tentando, desistem fácil ou muito rápido desse tipo de experimentação com a identidade.
"Depois de um ano pesquisando em salas de usuários do jogos com personagens (MUDs), Lori Kendall expressou considerável pessimismo sobre a possibilidade desse tipo de mudança; não importando o sexo que as pessoas haviam escolhido para seus personagens, a maioria era em geral pressionada a revelar sua identidade sexual na vida real. De resto, sempre que tentavam encenar o gênero oposto,os jogadores em geral recaíam em estereótipos, o que talvez possar vir a reforçar mais do que desetabilizar o pensamento convencional acerca dos gêneros", escreve em síntese, sobre a manipulação de identidade de gênero no ciberespaço, Brenda Danet [37].
No Brasil relato de etnografia on-line feito em moldes semelhantes fornece elementos para tirar a mesma conclusão, ainda que essa colida com a da autora do estudo, presa, segundo nosso ver, às prescrições de seu referencial teórico e interpretativo. Passando em revista os tópicos de questionário respondido por usuários de uma sala de conversão focada nos temas de interesse do público homossexual, a autora constatou que a maior parte dos informantes afirmou dizer a verdade na Internet. "Quase todos, assumem sua opção sexual tanto na internet quanto fora dela", escreve, citando como exemplo expressivo do caso a seguinte declaração de um informante: "atualmente,considero miha orientação sexual um dado importante e indissociável da minha subjetividade. Quem quiser se relacionar comigo deve me aceitar como eu sou" [38].
Deixando de entrar no mérito intrínseco ou conteúdo valorativo dessas experiências, revelam todas elas, nos parece, um fato social bem evidente, que é uma certa inclinação ao conformismo espiritual e ideológico da maior parte dos usuários de serviços de Internet. Ninguém pretende negar que os mecanismos por ela desenvolvidos vêm facilitando em vários sentidos os contatos sociais, multiplicando-os, mas sem, em geral, mexer na consciência dos sujeitos envolvidos. Weber afirmava que o homem não deseja 'por natureza' fazer algo distinto do que está acostumado, limitando-se a procurar ganhar o bastante para ver esse desejo atendido. A Internet não parece ser uma força capaz de provocar os abalos com que se pode passar a pensar em uma reviravolta na vida de um grupo social, salvo é claro se se tornar mediação de um processo de mudança induzido a partir da ação concreta no âmbito de alguma instituição histórica.
Nesse sentido, as tecnologias de comunicação interativa e virtual poderiam ser melhor vistas, cremos, como um sintoma e, ao mesmo tempo, uma resposta à crescente atomização da sociedade contemporânea. Quem sabe as pessoas não recorrem ao ciberespaço, formado por redes anônimas, fluidas e sem centro, para, de forma até certo ponto irônica, combater o solipsismo e mal-estar gerados pela fragmentação das condições de vida e flexibilização das identidades que caracterizam a condição pós-moderna, surgida paradoxalmente com a ajuda dessas tecnologias.
A capacidade de controle da situação e os mecanismos de defesa por elas propiciados, malgrado tudo, ensejam contextos em que, virtualmente, verifica-se uma reapropriação do sentimento de constituir um eu mas, por isso mesmo, a figura do sujeito não é superada: em última instância "o outro não é realmente outro, mas apenas um momento de meu próprio vir a ser (self-becoming)"[39], senão objeto das fantasias de poder do sujeito espectral, pois a comunicação descentrada, descarnada e livre com que se idealiza o ciberespaço é, “realmente, posta em cheque por um sistema imaginário que nele reinscreve a oposição binária entre o eu e o outro”[40].
A tendência dominante nas salas de conversa, conclui outro relato etnográfico, é "reivindicação do mesmo" .
"Continuando centrados em si mesmos, os internautas, pelo menos em sua maioria, não conseguem abrir-se ao outro; deixar-se contaminar pelo inusitado dos encontros com as diferenças. Continuam sós, com a sensação narcísica de estarem convivendo socialmente. Eles vão em busca de si mesmos. Vivem do diálogo consigo mesmos"[41]
Destarte pode-se ver com simpatia o entendimento de que em geral "o emprego ritual do equipamento serve para reforçar a identificação das pessoas com os fluxos de capital e poder que misteriosamente regem suas vidas fazendo paródias de desastres naturais [e que se fazem presentes nos jogos de computador]: explosões de conhecimento, ondas de crimes, quebra de bolsas de valores, a Tempestade no Deserto" [42].
Palmer notou que "as pessoas que passam seu tempo interatuando nas redes de computadores conhecem o poder que consiste em manipular a percepção dos outros e em criar novas identidades que podem fortificar sua auto-imagem ou, quem sabe, projetar melhor suas mensagens individuais"[43] (1995, p. 293); e relatos de etnografia on line comprovam que às salas de chats e jogos virtuais, para não citar os casos de pirataria eletrônica, não são estranhas pessoas cujo objetivo não é flexibilizar o eu mas manipular personagens e explorar as situações em sentido egoísta[44] (Ito, 1996,p. 98-99).
A tecnologia em si mesma não muda o espírito e o sentido dominantes na ação social. As máquinas e programas interativos que conhecemos reproduzem os esquemas sociais de conduta. Apenas para citar um exemplo, notemos a maneira como os videojogos informatizados nos preparam para exercer as funções e habilidades que temos de lançar mão, se quisermos sobreviver na presente sociedade. Os protagonistas desses jogos operam, em geral, como imagens de nossos alter-egos, figuras sujeitas à todo o tipo de reificação e, no limite, destruição. Os cenários ensejam a realização eletrônica de nossas fantasias de poder, muito mais do que um aprendizado sobre as complexidades da existência e as maneiras como se pode levar uma vida boa e criativa. O sentido prevalecente é o de nos treinar no tipo de subjetividade requerido pelo capitalismo.
"Nesses jogos, o usuário não apenas se identifica com a imagem mas a controla de acordo com regras de conduta rígidas - ou pior, pois a sanção para sua burla costuma ser uma sentença de morte virtual, de modo que o conformismo se estende do assento em que estamos à ação [encenada através da máquina]" [45].
A citação sugere de maneira bastante clara que as tecnologias de informação ora em curso de desenvolvimento parecem pouco inclinadas, de fato, a transformar em outra a figura do sujeito da consciência que está na base do chamado projeto moderno.
Sherry Turkle cita vários casos que, segundo nos parece, servem de apoio à tese de que é esse caso, ao invés de como ela deseja, em um dos mais amplos relatos de pesquisa feitos até agora sobre matéria:
- Stewart, estudante de física, declara, por exemplo, que "ele não joga com papéis": o ciberespaço é, antes, uma forma de descobrir seu eu ideal, "permitir que tenha uma melhor versão de si mesmo" [46](Turkle, 1996, p. 163).
- Outra pessoa, uma desenhista, diz que se sente muito mais perto de si quando está conectada a rede do seguinte modo: "sou muito mais extrovertida, menos inibida. Diria que me sinto mais como eu mesma. Sinto-me mais como eu desejo ser"[47] (Turkle, 1997, p. 227).
- A experiência tremendamente liberadora relatada por outro informante, portador de problemas de inibição, dá conta por sua vez de que "[seu] personagem eletrônico difere bastante de sua pessoa desconectada" porque, em muitos sentidos, ele "sente-se mais eu em [sua] personagem eletrônica" (idem, p. 392)
- Nos MUDS (Multiple users dungeons), que tiveram seu auge antes do advento da Internet, assegura uma escriturária, podemos ser várias coisas, mas com uma ressalva: "Consigo expressar cada parte de mim de forma mais completa do que no mundo real. Desta forma, ainda que interprete mais de um eu, sinto-me mais como eu mesma quando pratico mudging" (idem, p. 235)
Turkle afirma que esse sentimento de ser o si mesmo contradiz a experiência de identidade feita no virtual, porque essas implicam "diferenciação, multiplicidade, heterogeneidade e fragmentação" (idem, p. 235). A contradição, se existe, reduz-se porém à lógica, sendo aparente do ponto de vista histórico-sociológico. A conquista da autoconsciência tendeu a ser, até agora, correlata à perda do sentido de comunidade, pois a modernidade procedeu a um parcelamento da alma do indivíduo. Desde que se delineia seu processo de afirmação, acontece de as organizações não terem o que fazer com várias partes do eu e, quando é esse o caso, acabam satisfazendo apenas parte das necessidades do indivíduo.
As tecnologias de comunicação funcionam de acordo com esse espírito e, portanto, podem se entendidas como uma mediação do solipsismo vigente na cultura contemporâneo. A pesquisa confirma que, embora possa haver tendências opostas, reforça-se nelas o sentimento moderno de se estar "consciente de mim mesmo como eu mesmo" e no qual se funda a subjetividade do homem moderno[48] (Hawthorn 1982, p. 42).
Conforme dizia Kant, somente o eu que pensa e comanda é sujeito: "O eu como um objeto, o eu que está sendo percebido, é simplesmente uma coisa como todas as outras que existem fora de mim" (apud Hawthorn, p. 42). O filósofo refere-se, como se vê, ao eu psicológico, mas sua assertiva também valeria para os personagens em que se incorpora externamente, como acontece com os exercícios de identificação praticados na esfera pública virtual ora em emergência.
Afinal de contas, as comunidades virtuais são todo o oposto de uma comunidade, se entendermos pela expressão os regimes de associação nos quais o indivíduo não só se conserva como um todo mas tem esse todo sujeito à vontade de instâncias supra-individuais. Contrariamente ao suposto, as redes são formas de interação de massas. As conexões dominantes as segmentam de acordo com interesses especializados, pressupondo, na base, átomos sociais egoístas e egocêntricos.
Funcionando de modo a conter as tendências à ruptura da sociabilidade[49] (Maffesoli, 1987, p.61 e 194-195), a cibercultura liga sujeitos atomizados, porque, forçados a se dispersar socialmente e cada vez mais segmentado, o homem tende a reduzir a um ponto abstrato, descobrindo-se um ente em si mesmo distinto: simultaneamente, como a única fonte de valor e como um vazio, para o qual a vida, cada vez mais, existe como aquele conjunto de possibilidades tão bem retratado literariamente por Musil.
O significado histórico-cultural dessa relativização do processo de descentramento do sujeito é, sem dúvida, matéria de disputa. Recentemente, verificou-se entre os pensadores sociais da modernidade uma reação às teses sobre a perda de sentido do eu na era virtual, conforme defendida pelos filósofos da técnica. O resultado das tecnologias sobre o eu não é, segundo os primeiros, a sua dispersão mas, sim, uma mudança de natureza. A profusão de relações e imagens com que o homem se vê confrontado não o dissolve como entidade coerente. Acontece antes de ele ser aberto por elas em grau que as faz ter um papel cada vez maior em seus processos de formação como indivíduo[50] (Thompson, 1995, p. 232-233).
Thompson se baseia sobretudo em Giddens para, acertadamente, segundo nosso modo de ver, caracterizar o eu como construção narrativa. A subjetividade humana não é dada: é produto de um projeto reflexivo, conduzido pelo próprio indivíduo, através do emprego dos recursos culturais postos a sua disposição pela sociedade. A subjetividade é construída, conduzida e modificada por meio das relações sociais em que os seres humanos se inserem, tanto quanto pela atividade reflexiva que daí surge. Resulta, em síntese, do emprego mais ou menos consciente e calculado dos saberes que, por via dessas relações, nos chegam ao conhecimento.
Destarte, o pensador sugere que a proliferação de estilos de vida e a capacidade de criar novos personagens para si mesmo que se observa hoje em dia constituem uma forma de os indivíduos se reapropriarem, senão criarem, seu modo de ser e em relação a qual não é desprezível a ação da mídia. As tecnologias de comunicação colaboram para tornar o processo de construção do eu mais reflexivo e pessoal, ao estimular "os indivíduos a voltarem-se para os seus próprios os recursos a fim de construírem uma identidade coerente para si mesmos" (idem, p. 207).
O problemático com toda essa empresa é o rebaixamento para um plano menor do fato de que esses estilos, certamente criados por nós mesmos, não só são prisioneiros da forma mercadoria como se caracterizam por uma fragmentação, estreiteza e volatilidade que, ao invés de ajudar os indivíduos a desenvolverem livremente sua identidade, podem ser também um fator de agravamento das tendências à sua desintegração.
Slevin (2000) apoia-se em Giddens (1991) para analisar a estrutura e sentido da reflexividade ensejada pela Inernet, sublinhado a possibilidade desse perigo [51]. Segundo ele, o projeto reflexivo do eu é tornado possível por uma situação que igualmente o expõe a uma crônica crise de identidade (157-180), como há muito tempo, aliás, haviam visto Scheler, Simmel e Nietzsche. Cosntruindo páginas na Internet ou interagindo emchats, por exemplo, "as pessoas podem ser engajadas de forma positiva, usando esses expedientes para desenvolver estratégias e habilidades para, ativamente, manter afastadas a falta de sentido e a repressão existentes em sua vida cotidiana" (Slevin, 171-172).
A possibilidade de que a situação que tornou o referido projeto viável seja também um obstáculo insuperável para sua universalização, reduzindo-a a certa contingências, constitui, porém, uma questão que, embora ainda em aberto, não pode ser escamoteada. Procedendo de maneira pouco determinada em propor um julgamento, o pesquisador se põe a salvo de erros, mas ao preço de expor uma análise puramente formal que, sob pretexto de manter ambiguidade e abertura do processo subjacente ao fenõmeno, se torna anódina do ponto de vista crítico e hermeneutico.
Segundo nosso entendimento, contrariamente, "qualquer tentativa futura ou em andamento de responder socialmentes [aos nossos problemas] precisa partir da consideração do contexto de relações desiguais de poder que influencia nossas intenções e, portanto, que filosofias, ideologias e discursos são transformados em tecnologia e por essa via naturalizados socialmente" Hillis 191).
Deixando de lado o exame das fantasias de poder que se fazem presentes nesse cenário e as tecnologias informacionais potencializam em vários sentidos, precisamos conservar a consciência crítica de que a pluralização dos papéis sociais, relações de gênero e personagens ficcionais passíveis de emprego através delas é pois, historicamente, uma condição favorável do projeto reflexivo ao mesmo tempo que um fator de estímulo da crise da identidade em que nos projetou a modernidade.
O descentramento do sujeito por elas incentivado é algo que, estruturalmente, pode se visto como uma condição para a livre formação do eu mas, também, como um fator de acentuamento da tragédia que essa crise representa para a idéia de indivíduo. Caberá à práxis humana consciente, sempre onde ela for possível, decidir a direção dominante que tomará todo esse movimento de caráter tecnológico mas cuja natureza, em última instância, é social e histórica.
Finalizando, caberia observar de todo modo que as possibilidades contidas nas tecnologias informacionais tornaram-se algo que sequer pode ser visto. Trabalhamos em área onde o princípio absoluto é o da incerteza. A sociabilidade espectral a que nos referimos nestas páginas bem pode pertencer a um período romântico, cujos dias estão contados. Podemos imaginar, por exemplo, que, em pouco anos, da mesma forma que a película sonora pôs fim à era do cinema mudo, a televisão venha a tomar o lugar da escrita como paradigma de relacionamentos no ciberespaço.
As possibilidades de criação no campo da realidade virtual parecem ilimitadas e, por isso, eventualmente os personagens que o povoarão terão três dimensões, radicalizando a combinação do real com o imaginário que define o simulacro como nova fonte de experiência [52](cf. Shapiro & McDonald, 1995, p. 323-345).
A revolução em curso hoje em dia levanta questões que só o futuro permitirá discutir com segurança. A flutuação da identidade terá prosseguimento ou será superada por alguma forma superior de consciência? Qual será o valor dominante nos jogos com câmaras e máquinas de simulação que estão por ser inventadas? O consenso a que podemos chegar hoje é limitado e poderia ser resumido dizendo-se que o indivíduo segue em crise de identidade e o terreno da realidade virtual é um dos seus laboratórios de experimentação.
No futuro, as tecnologias da mente podem vir a ser um suporte dos novos romances de formação mas, também, pode ser que a flutuação da identidade por elas radicalizada se esgote no mero jogo, tornando-se estéril, senão improdutiva, do ponto de vista do indivíduo[53]. Também temos razões para pensar que, liquidando-se o sujeito, "ao invés de cancelá-lo para superá-lo em uma figura mais elevada, isso operaria não em regressão da consciência mas antes em recaída na barbárie"[54].
Poderia é certo haver ainda a aclimação da nossa crise de identidade na consciência do indivíduo, a realização da profecia nietzscheana do artista, do livre jogo dionisíaco; mas também pode ser que, por isso mesmo, o indivíduo, sempre que se fizer presente, insista em descobrir quais podem ser seus caminhos como singularidade.
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Notas
[1] Taylor, Charles: Sources of the Self. Harvard: Harvard Univ. Press, 1989, p. 143-176.
[2] Sfez, Lucien: Critique de la communication. Paris: Seuil, 1993, p. 192.
[3] Poster, Mark: The second media age. Londres: Polity, 1995, p. 32-33.
[4] Ehrenberg, Alain. L'individu incertain. Paris: Hachette, 1999, p. 284.
[5] Lipton, 1996, p. 343)
[6] Trivinho, Eugênio. Redes: obliterações no fim de século. São Paulo; Fapesp / Annablume, 1991998, p. 126.
[7] (Guillaume, Marc: 1989 , p. 82)
[8] (Gergen, Kenneth: 1996, p. 135).
[9] Le Breton, David: l"Adieu au corps. Paris: Métailié, 1999, p. 1999.
[10] Cf. Hakken, David: Cyborgs @ Cyberspace ? Nova York: Routledge, 1999.
[11] (Gergen, Kenneth: The saturated self. Nova York: Basic Books, 1991, p. 146-147.
[12] (Maffesoli, 1987, p. 41).
[13] (Lifton The prtean self. Nova York, Basic Books, 1993, p. 9).
[14] Simmel, Philosophy of money, p. 296.
[16] Marx, K. Manuscritos económico-filosóficos. México: FCE, 1962, p. 185. Cf. Adorno, Theodor, Consignas. Buenos Aires: Amorrortu, 1973, p. 143-158.
[17] Simmel, Georg, Sociología. Madri: Alianza, 1987, p. 792-793.
[21] Simmel, El individuo y la libertad, p. 129-130. Birgitta Nedelman examina a conexão deste problema com o da tragédia da cultura no artigo citado na nota 65.
[22] (Turkle, 1997, p. 235)
[23] Guillaume 1999: 11-56.
[24] (Whittle, 1997, p. 193; Cf. Shapiro e McDonald, 1995).
[25] Apud Bromberg, H. “Are MUDs communities ?”, em Shields, Cultures of Internet, p. 146. Confira o comentário correlato de Ken Hillis (”A geography of the eye”, op. cit., p. 92-93).
[26] Citado por Alain Ehrenberg, op. cit., p. 288, que se detém sobre essa faceta da nova tecnoltura. Maria Pini propõe elementos comparáveis para pensar esse tempo, embora não concordemos com sua análise, em Peak practices: the production and regulation of ecstatic bodies" (In Virutal bodies 168-177).
[27] (Lisa Blackman Culture, tehnology na d subjectivity, p. 133).
[28] Mandosio, J.M. Après l'effondremenet. Paris: L'Encyclopedie des Nuissances, 2000, p. 141.
[29] Cf. Hakken, David: Cyborgs @ Cyberspace ?, op. cit., passim.
[30] (Turkle, 1996, p. 158
[31] (Lasch, 1983, p. 122-128).
[32] Borsok, Paulina. Cyberselfish. Nova York: Public Affairs, 2000, p. 206.
[33] Borsok, op. cit., p. 234-235. Cf. Stone, Rosanne. The war of deseire and technology at the close of the mechancial age. Canbridge (MA): MIT Press,1995, p. 121-164.
[34] (Jordan, Tim. Cyberpower, the culture and politics of cyberspace. Londres: Routledge, 1999, p. 206. Dominique Wolton pensa o problema de forma semelhante, todavia colocando-o no registro de uma teoria social e política da comunicação, em Internet, et après ? Paris: Flammarion, 2000).
[35] Stallabras, 118) .
[36] Machado da Silva, Juremir, “Por uma teoria da perdição”. In – Textos de comunicação e cultura 37/38 (5-16) 1997.
[37] Danet, brenda. Text as mask: gender, play and performance on the Internet. In Steven Jones (org.): Cybersociety 2.0 Thousand Oaks (CA): Sage, 1998, p. 149.
[38] Nussbaumer, Gisele. Fora do Armário: a cibersocialidade em uma lista de discussçao GLS. In André Lemos e Marcos Palácios (orgs.): Janelas do Ciberespaço. Porto Alegere: Sulina, 2001, p. 93.
[39] Foster, Derek, “Community and identity in the electronic village”, em Porter, Internet culture, p.26-27.
[40] Bailey, Cameron, “Virtual skin”, em Moser, M. & MacLeod, D. (editores): Immersed in technology. Cambridge(MA): Harvard University Press, 1996, p. 35. Em O culto da informação (São Paulo: Brasiliense, 1988, p. 107-117), Theodore Roszak sugere que um dos fatores de atração popular dos computadores é o sentimento de poder individual que dá ao usuário socialmente impotente. “O computador é ... sedutor porque faz com que você se sinta poderoso: ele é bom para o ego”, diz um dos porta-vozes da nova classe (Jaron Lanier, apud Moser & MacLeod, op. cit., p. 127).
[41] Júlio A. Pinto: "Redes digitais: uma nova sociabilidade ? In - Rubim, ª Benz, I & Pinto, Milton [orgs]: Práticas discursivas na cultura contemporãnea. São Leopoldo: Unisinos, 1999, p. 126-127). André Lemos expoôe outro ponto de vista em "Ciber-socialidade, p. 7-22).
[42] (Brook & Boal, 1995: x).
[45] Stallabrass, Julian. Gargantua, manufactured mass culture. Londres: Verso, 1996, p. 89. Cf. Schroder, Ralph.
[50] Thompson, p. 232-233
[53] Ehrenberg observa que o horizonte imaginário dos jogos de vídeo, como o da televisão, é, para seus promotores, a realidade virtual. A biônica conectará o cérebro aos computadores através de implantes capazes de transmitir ondas em baixa freqüência. Primeiro, porém, "os fabricantes de jogos 'farão tudo para quebrar o isolamento dos jogadores', ligando-os através de conexões telefônicas, a fim de que possam interagir sem presença física. No futuro um pouco mais distante, os monitores e manetes desaparecerão: os fabricantes de computadores desejam substituir os últimos por comandos vocais e os primeiros por simuladores sensoriais, que permitirão ao jogador 'sentir' todo um mundo à sua volta. 'A tela será substituida por um par de lunetas fixas, de modo que não será possível ver qualquer outra coisa que o que desfila diante dos olhos: esse sistema permitirá ter uma ilusão de relevo satisfatória'" (L'individu incertain. Paris: Hachette, 1999, p. 279).
[54] Adorno, 145.